quinta-feira, 8 de julho de 2010

o velho carro


Henrique tinha já pedido a reforma havia muitos anos.

Eram um casal feliz, uns 50 anos de casados, bem vividos e sem filhos: porém, tinham encontrado a sua fecundidade nos sobrinhos e em muitos amigos com quem conviviam.

Aos 74 anos, Margarida era a companheira ideal: sempre tivera sensibilidade e esperteza, coibindo-se de opinar ou de intervir quando se apercebia de que a sua acção era extemporânea e Henrique retribuíra-lhe com amor, respeito e ouvia-a bastas vezes.

Tinham um carro, que se tornara velho pelos muitos anos de uso, mas que guardavam com carinho pois fora nele que tinham passado bons momentos de cumplicidade, admirado nasceres e pores-do-sol memoráveis, viajado para terras e lugares aonde se maravilharam com o que viram, partilhando horas de conversa ou ouvindo música em silêncio e assim construindo a sua vida a dois.

Chegara o dia em que por prudência e por lei já não podiam ou deviam conduzir mais o seu velho carro que foi ficando indolentemente parado, estranhamente sem manutenção, debaixo das ramagens das árvores do jardim.

Henrique ainda ponderara vendê-lo ou mandá-lo abater, mas de comum acordo, resolveram que acabasse os dias como eles, envelhecendo tranquilamente.

MNA

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