segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Drummond eternizado em Copacabana


E como ficou chato ser moderno.
Agora serei eterno.
……………………………….

Eterna é a flor que se fana
se soube florir
é o menino recém-nascido
antes que lhe dêem nome e lhe comuniquem o sentimento do efémero
é o gesto de enlaçar e beijar
na visita do amor às almas
eterno é tudo aquilo que vive uma fracção de segundo
mas com tamanha intensidade que se petrifica e nenhuma
força o resgata

é minha mãe em mim que a estou pensando
de tanto que a perdi de não pensá-la
é o que se pensa em nós se estamos loucos
é tudo que passou, porque passou
é tudo que não passa, pois não houve
eternas as palavras, eternos os pensamentos; e
passageiras as obras.

Eterno, mas até quando? é esse marulho em nós de um
mar profundo.

Naufragamos sem praia; e na solidão dos botos
afundamos.

É tentação a vertigem; e também a pirueta dos ébrios.
Eternos! Eternos, miseravelmente.

O relógio no pulso é nosso confidente.

Mas eu não quero ser senão eterno.
Que os séculos apodreçam e não reste mais do que uma
essência ou nem isso.
E que eu desapareça mas fique este chão varrido onde
pousou uma sombra
e que não fique o chão nem fique a sombra
mas que a precisão urgente de ser eterno bóie como uma
esponja no caos
e entre oceanos de nada
gere um ritmo.

Carlos Drummond de Andrade

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

MINI Countryman TV Commercial: Flow

Há Momentos


Há momentos na vida em que sentimos tanto
a falta de alguém que o que mais queremos
é tirar esta pessoa de nossos sonhos
e abraçá-la.

Sonhe com aquilo que você quiser.
Seja o que você quer ser,
porque você possui apenas uma vida
e nela só se tem uma chance
de fazer aquilo que se quer.

Tenha felicidade bastante para fazê-la doce.
Dificuldades para fazê-la forte.
Tristeza para fazê-la humana.
E esperança suficiente para fazê-la feliz.

As pessoas mais felizes
não têm as melhores coisas.
Elas sabem fazer o melhor
das oportunidades que aparecem
em seus caminhos.

A felicidade aparece para aqueles que choram.
Para aqueles que se machucam.
Para aqueles que buscam e tentam sempre.
E para aqueles que reconhecem
a importância das pessoas que passam por suas vidas.

O futuro mais brilhante
é baseado num passado intensamente vivido.
Você só terá sucesso na vida
quando perdoar os erros
e as decepções do passado.

A vida é curta, mas as emoções que podemos deixar
duram uma eternidade.
A vida não é de se brincar
porque um belo dia se morre.

Clarice Lispector

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

O mais espantoso nos velhos


O MAIS ESPANTOSO NOS VELHOS É A SUA FALTA DE PRESSA, COMO SE ELES DISPUSESSEM DE TODO O TEMPO QUE TERIAM OS NOVOS SE NÃO TIVESSEM TANTA PRESSA.

Mário Quintana

explicação da eternidade


devagar, o tempo transforma tudo em tempo.
o ódio transforma-se em tempo, o amor
transforma-se em tempo, a dor transforma-se
em tempo.

os assuntos que julgámos mais profundos,
mais impossíveis, mais permanentes e imutáveis,
transformam-se devagar em tempo.

por si só, o tempo não é nada.
a idade de nada é nada.
a eternidade não existe.
no entanto, a eternidade existe.

os instantes dos teus olhos parados sobre mim eram eternos.
os instantes do teu sorriso eram eternos.
os instantes do teu corpo de luz eram eternos.

foste eterna até ao fim.

José Luís Peixoto, in "A Casa, A Escuridão"

domingo, 19 de dezembro de 2010

NATAL


Natal significa nascimento. Não de uma pessoa comum. Todos sabemos. O Natal foi criado para se comemorar o nascimento de Jesus.

E daí? Ora, Jesus significa para os cristãos, salvação. Salvação? Salvar de quê? Por que razão? Para quê? Qual é o sentido deste nascimento? Será que Natal é isto que vivemos todos os anos? Será que é suficiente entrar num clima natalício para sermos todos “abençoados”?

Reconheço a insegurança e a transitoriedade desta vida. Neste período recebemos muitas mensagens de paz, de amor, de prosperidade, muitos “fluidos” positivos. Há uma atmosfera fraterna e religiosa no ar.

As pessoas enlevam-se com músicas familiares de Natal; músicas que nos embalam desde crianças, luzes a piscar, as ruas agitadas com gente em busca de um presente ou presentes para pessoas amadas, os preparativos da ceia de Natal; um lauto jantar – claro, para aqueles que podem! – tudo isto mostra-nos uma participativa confraternização.

O que importa é a atmosfera de festa, de alegria, pois é Natal. Quem quer parar para reflectir sobre o verdadeiro sentido do Natal? O que importa é o que sentimos, não o sentido real!

E desta forma o verdadeiro sentido do Natal esvai-se, e restam-nos apenas ilusões de uma sociedade de consumo misturada com o sentimentalismo das boas ideologias humanistas – “faça o seu Natal com os pobres”.

Isto sem falar de alguns (des)orientadores religiosos, os quais se auto-apascentam ao contrário de apascentarem as “ovelhas de Cristo”.

Não é à toa que a figura do Pai Natal e todo o clima comercial natalício a muitos encanta! As luzes deste Natal são uma felicidade artificial provocada por um alucinogénio mentiroso, cujo clima é uma nuvem espessa de ignorância.

Deus não deve estar nada interessado numa humanidade sentimentalista, cheia de “ boas intenções” em períodos natalícios, quando essa mesma humanidade passa o ano inteiro “a puxar o tapete” ao próximo, mentindo, enganando, esbanjando ridículas vaidades, cometendo injustiças e torpezas, inchada de arrogância, discriminando, constrangendo moralmente, envolvida em intrigas e calúnias, disputas desonestas, traindo, ameaçando, sendo revanchista, impiedosa e hipócrita.

E ao aproximar-se a atmosfera natalícia, beijamo-nos, abraçamo-nos e confraternizamos fingindo amizade e amor.

Os meus votos, para si caro leitor paciente e amigo do meu blogue, é que possa dar sentido às palavras tão rotineiras, como: PAZ, UNIÃO, AMOR E PROSPERIDADE.

Um ouriço a dilatar-se


O livro de António Lobo Antunes é um diário. Reportado ao ano de 2007. Parei no dia 25 de Março. É dia em que faço anos. Não me lembro onde estava nesse dia ou com quem. Nem se festejei ou festejaram o dia dos meus anos. Fiz contas para ter a certeza de quantos anos eram e estou incerto quanto a ter-me enganado na subtracção.

Compreendo-a, por isso, hoje, a essa escrita, implosão de um ser de que escorrem, viscosos como uma dor nojenta, as vísceras pelas paredes do presente, literárias mas tripas sempre e seus conteúdos sulfídricos, dejectos de memória como uma compota escorrente mais o coração a latejar e um mundo feio quando cerebral vazio de pensamento, e uma ânsia furiosa de beleza e formas boleadas, femininas e reconfortantes quando desinquietam, e sempre o eternizável momento de um fundo olhar vindo do desejo, «aulas tão compridas, dias tão compridos, noites eternas» e a madrugada da desolação solitária.

Leio-o agora em 2010, e 2010 acaba breve, e ele escreveu tudo isso ainda este ano, e editaram-no, rápidos porque há pouco tempo, o tempo foge e ele luta contra o desaparecimento seu e nosso e lêem-no menos, eu próprio leio-o agora por piedade para com os meus remorsos de o ter desprezado, mas não há outra escrita possível porque não há outra vida, fragmentária, «a pele das mulheres tão suave e o consentimento, a avidez».

É domingo. Vou levar tempo a ler-te António Lobo Antunes e a este teu livro e escreverás outro, sempre o último até um dia em que acertarás para fortuna de todos os críticos e os memorialistas e os que purgam os maus instintos e as azias do desprezo para com todos os outros comemorando, olha outra dia foi o Carlos Pinto Coelho e o Herman José a dizer que teve uma morte digna porque foi de repente e ninguém riu.

António Rebelo da Silva

sábado, 18 de dezembro de 2010

tau-tau



O caos e a desordem, a organização e o método, a sedução e a repelência, a vontade de deitar a mão e as ganas de fugir a sete pés, o mundo diverso mesmo quando perverso e o seu reverso! Fanfarras e fanfarrões, figurinhas e mulherões.

Os chineses têm um provérbio interessante que diz «nunca feches uma porta pela qual gostarias de entrar e nunca deixes aberta uma porta pela qual não gostarias que alguém entrasse». Mais do que sabedoria é a vida numa frase.

Uma pessoa chega à janela e vê que está a chover. Olha para o termómetro da rua e reza nove graus. Anoiteceu. Só resta fechar os olhos com força e forçar-se a imaginar. Aquecer-se por dentro e atirar-se de cabeça!

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

A dor do desemprego


Emprego e desemprego não são só estados sociais.

É verdade que o emprego (em especial alguns empregos) dá estatuto social, mas também permite o desenvolvimento pessoal e a realização profissional.

O indivíduo sente-se integrado num processo de desenvolvimento social para o qual contribui com o seu trabalho.

O trabalho é remunerado e, por conseguinte, ter emprego é ter a possibilidade de adquirir meios para a sobrevivência, diversão, cultura e outras manifestações tão importantes ao equilíbrio do ser humano.

Se o emprego proporciona tudo isto, o desemprego rouba-o, muitas vezes de forma cruel.

Na hora de reduzir aos “custos com o pessoal”, a notícia: “- Lamentamos, gostamos muito de si, foi sempre um funcionário exemplar, mas a empresa necessita de reduzir custos...”, dói, dilacera.

O ter sido dispensado de uma actividade, não contarem com os seus préstimos, provoca em cada indivíduo uma sensação dolorosa e a maior parte das vezes associada a um sentimento de injustiça.

Para quê tanto esforço?! Horas extraordinárias sem remuneração?! Apenas e só o sentido do dever a ditar horas de permanência para além do horário!

A família que, a bem do trabalho, conformada com a ausência, aceitando que as férias sejam reduzidas a duas semanas, poderá não compreender o despedimento!

Angústias sentidas que, a certeza de tudo ter feito para ser um empregado exemplar não acalmam, pelo contrário, são dores difíceis de conter. Não dói a consciência mas dói a alma.

E aos poucos, a dor cede o lugar ao desalento. Instala-se a dúvida e põem-se em causa capacidades.

Triste com o presente e assustado com o futuro, o indivíduo inicia processos de autodestruição podendo acabar, em alguns casos, no suicídio.

O assalto e roubo do meu relógio e a paciência de Job


Job é o exemplo de como se pode passar dos 80 aos 8. De como é fácil, num sopro, perdermos tudo, perdermo-nos, ser-nos tirado o que nos foi dado.

Job personifica a dificuldade que temos em lidar com o que de mau nos aparece. De como nos é fácil dizer que quando alcançamos o bem, o alcançamos sozinhos, e de como quando o perdemos, pensamos que o perdemos por causa de outros.

A paciência, por outro lado, é o saber esperar pelo que de bom há-de vir. O saber que o mal não é eterno, mas parte do processo.

Job passou dos 80 aos 8 e aos 80 novamente. É por isso que dizemos que é preciso «ter paciência de Job». Porque, mais tarde ou mais cedo, algo de bom acontece. Porque não há mal que sempre dure, nem bem que nunca acabe. Porque «a vida não passa de um sopro».

Job tomou a palavra, dizendo:

«Não vive o homem sobre a terra como um soldado?
Não são os seus dias como os de um mercenário?
Como o escravo que suspira pela sombra
e o trabalhador que espera pelo seu salário,
assim eu recebi em herança meses de desilusão
e couberam-me em sorte noites de amargura.
Se me deito, digo: ‘Quando é que me levanto?’
Se me levanto: ‘Quando chegará a noite?’
e agito-me angustiado até ao crepúsculo.
Os meus dias passam mais velozes que uma lançadeira de tear
e desvanecem-se sem esperança.
Recordai-Vos que a minha vida não passa de um sopro
e que os meus olhos nunca mais verão a felicidade».

Se apanho o ladrão do meu Frank Muller, não há cá paciência de Job!

O caraças é o que é!