quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Carta de fim de Verão ao meu primo Luis Bernardo


Meu Caro Luis Bernardo,

Setembro está no fim e começa a rentrée. Quase todos regressaram de férias e o sol, a praia, o campo, a ociosidade e lazer acabaram para a maioria o que lhes permite poderem debruçar-se com mais interesse sobre assuntos importantes para o espírito.

Volto, assim, hoje ao teu contacto.

Muitos dos meus leitores têm comentado o eterno tema da vida para além da morte. Creio que foste suficientemente claro quando em correspondência anterior, a este assunto te referiste.

No entanto, aqui te deixo mais algumas reflexões sobre as quais gostaria de ter a tua opinião e que retratam as questões de muita gente.

Assim, se considerarmos a existência de um mundo « post mortem » completamente desvinculado e que não interfira com o mundo em que vivemos, então a ciência também nada é capaz de dizer sobre este pretenso mundo.

A ciência trata apenas das chamadas hipóteses com as quais se possam fazer testes e experiências que as refutem ou não. A ciência restringe o seu conhecimento apenas àquelas perguntas às quais ela é capaz de responder.

A falsidade ou refutabilidade de hipóteses é um critério científico básico e de importante referência na filosofia da ciência.

Para que uma determinada premissa de que “há vida depois da morte” seja considerada refutável ou falsa, ou seja, para que ela possa ser tratada pela ciência, deve ser possível realizar uma experiência física que tente mostrar essa presunção como falsa (ou, por exclusão, verdadeira).

Se não é possível fazer uma ligação entre um potencial mundo « post mortem » com o mundo a que chamamos real, através da realização de experiências que comprovem ou refutem a hipótese inicial, então esta questão sai do âmbito científico e entra para a esfera das crenças e misticismos.

É que a ciência, não se relaciona com o verbo “acreditar”. A ciência não acredita, sómente conclui.

Muitos cientistas afirmam que não temos nenhuma razão especial para acreditar que a consciência humana continue a existir depois da morte, tanto quanto a consciência de um búfalo ou outros animais, continue a ter experiências depois de morta.

Além do mais, temos provas muito fortes de que a consciência depende do funcionamento do cérebro e, portanto, a vida mental acaba com a morte deste.

A propósito, várias observações neurológicas realizadas em seres humanos provam que, quando determinadas regiões do cérebro são afectadas por doenças, traumas ou operações cirúrgicas delicadas, a consciência da pessoa é muitas vezes alterada, o que prova uma relação directa entre a biologia e a consciência.

Estas minhas considerações reforçam a ideia de que a nossa consciência está directamente ligada à nossa biologia e que a morte de uma, implica directamente a morte da outra.

A ciência encara a morte, portanto, como o fim das funções vitais de um organismo. A neurologia mostra que a consciência é o fruto claro das nossas complexas capacidades cerebrais e que esta está directamente ligada às nossas funções biológicas vitais. Portanto, para a ciência, a consciência de um organismo cessa no exacto momento da sua morte cerebral.

Assim, como a ciência não é capaz de responder a determinadas perguntas, as pessoas tendem a procurar as respostas que desejam no âmbito do misticismo e das religiões.

Por não terem qualquer relação directa com a realidade ou necessitarem de se mostrar verdadeiros, esses movimentos místicos frequentemente conseguem cativar adeptos que não são capazes de suportar, psicologicamente, a falta de sentido através da qual a ciência observa o mundo.

Mas isto, meu Caro primo, são as minhas considerações. O que pensas sobre tudo quanto acima te refiro?

Tens visto os meus Pais e algum dos meus Avós ? Se puderes conversa com o meu Avô materno que eu tão bem conheci e que me contava histórias da vida boémia de Lisboa dos anos 30.

Tenta que ele te desvende um pouco mais como tudo se passava, pois era um pândego !

Um abraço muito afectuoso e muito preocupado com tudo o que se passa neste nosso País.

Dizia-me uma amiga se eu conhecia outro planeta para ela emigrar, dás-me alguma sugestão ?

Manuel

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