terça-feira, 2 de novembro de 2010

Superar os grandes traumas inventando uma nova vida



Na vida humana, nem o bem-estar nem a felicidade duram muito. Quando eram felizes, os antigos temiam a inveja dos deuses. Mas não é preciso invocar os deuses; a inveja dos homens basta.

É fácil passar do aplauso ao pelourinho, da glória ao insulto. Sócrates foi condenado à morte, Cipião ao exílio, Galileu foi preso, Lavoisier, o criador da química, foi guilhotinado rodeado dos insultos do povo.

No entanto, a maior parte das vezes não é por causa da inveja que a nossa prosperidade e a nossa felicidade têm fim, mas por acidente, por causa de uma doença grave ou de um desastre económico.

Seja como for, o trauma é sempre repentino, inesperado, e nós reagimos com incredulidade. Parece um pesadelo e parece que em breve vamos acordar. Esforçamo-nos por continuar a nossa vida normal, só que aos poucos percebemos que a ansiedade não é um sonho, mas a realidade.

Para superarmos o trauma, para continuarmos a viver, para encontrarmos paz de espírito, só há um caminho: aceitar a nova situação, compreendê-la, adaptar-se a ela. É como sermos abandonados num novo mundo, desconhecido; não podemos manter os hábitos do passado e deixar-nos paralisar pela nostalgia.

Temos de aprender rapidamente a viver no novo ambiente, a estudá-lo, a perceber as oportunidades que nos oferece, a construir algo de novo nele.

Esta atitude serve, por exemplo, para enfrentar uma doença que nos obriga a tratamentos prolongados que nos deixam debilitados e nos força a mudar completamente de hábitos. Contudo, também se aplica quando ficamos sem um emprego e temos de aceitar outro mais humilde.

Lembro-me de alguns amigos intelectuais húngaros que emigraram depois da revolução: alguns conseguiram continuar a trabalhar em universidades, outros tiveram de passar para actividades comerciais.

Os judeus educados dos países de Leste foram obrigados a fugir da pobreza, das perseguições, dos massacres. Quando chegaram ao Novo Mundo tornaram-se comerciantes, banqueiros, joalheiros, escritores, músicos, cineastas, criaram Hollywood.

Tudo isto se aplica de uma forma muito particular hoje, com a globalização, a concorrência da China, o rápido desenvolvimento tecnológico. Em pouco tempo, a sociedade transformou--se e os velhos ofícios, os velhos negócios desapareceram. A escola continua a preparar os estudantes para profissões que já não existem. Neste território desconhecido, que devemos fazer?

Observar as pessoas, ver o que lhes faz falta, de que precisam: há oportunidades, necessidade de novas profissões. Não devemos ir para onde vão todos os outros, mas sim para onde vão apenas alguns e onde a procura é maior.

Francesco Alberoni
Jornalista e sociólogo

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