domingo, 6 de abril de 2014

Era uma vez um menino com a luz do sol nos olhos


Era uma vez um menino com a luz do sol nos olhos e um grande e rasgado sorriso.
Nem sempre, porém, acordava bem-disposto. Havia mesmo dias que eram bem cinzentos.
Apetecia-lhe pôr a cabeça debaixo de uma almofada, cobarde, sem querer olhar a realidade e enfrentar a crueza da vida.
Fazer o que tinha como deveres, cumprir as regras estipuladas era o pior dos sacrifícios. Os homens das cavernas que ele vira desenhados numas grutas, eram de certeza mais felizes.
Dormiam, comiam e procriavam ah… e puxavam pelos cabelos das mulheres. Não sabia se era um gesto de amor ou de posse ou uma pose familiar para o desenhador das cavernas.
Pensava, que maçada deve ser não ter vontade para nada fazer  e passar as horas de olhar vago no horizonte, com a boca a saber a papel de música.
Sempre se perguntara qual é a beleza de um deserto, quente, tempestades de areia, silêncio…os profetas comiam gafanhotos e rezavam…como conseguiam? Sim, como apetece? A solidão ao extremo enlouquece e faz perder a noção da realidade…talvez tivessem alucinações…
O menino, aterrorizado com estes pensamentos, voltava a desejar por a cabeça debaixo, agora de um almofadão, macio e de penas de pato.
Vale a pena ter a luz do sol nos olhos e um bonito sorriso neste mundo tão enfadonho e pesado?
Um dia o menino passou a ter escuridão no olhar e um esgar de dor pois o sol foi-se da sua vida.
Foi, como não podia deixar de ser, o momento da sua morte.
Triste crónica de um D. Sebastião, tão igual a tantos de nós. 

In prosas bárbaras de Vicente Mais ou Menos de Souza

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