sábado, 10 de dezembro de 2011

Resposta do meu primo Luis Bernardo - Salazar e outros familiares


Meu Querido Manuel,

Muito obrigado pela tua missiva.

Apanhaste-me em plena época de Natal e cheio de visitas e afazeres.

Tens razão, na noite de 24 para 25 isto enche-se tudo de luz, de cânticos, de alegria contagiante e é muito bom.

Fui tratar dos teus “presentes” e aqui tens o meu relato:

1. Encontrei o teu Pai na sala que dá para o tal jardim que tu tão bem gabas, pois é um primor de cores das flores com os seus perfumes, de trinados de variegados pássaros canoros, do esvoaçar de borboletas exóticas, com um relvado imenso a perder de vista com árvores frondosas e raras.

Tinha uma visita: um político conhecido dos seus tempos, que a tua Mãe me disse ser Salazar.

2. Apresentou-mo e sentei-me sem querer interromper uma conversa que percebi ir a meio e sobre Portugal.

3. A tua Mãe ofereceu-me de beber um sumo delicioso e comecei a ouvir o que discutiam.

4. No meu tempo, havia Monarquia e por isso a minha cultura sobre o dito Salazar era unicamente a de ouvir vários parentes nossos mais novos do que eu e que com ele tinham servido, nomeadamente o teu Tio Luis, Almirante, que foi Secretário da Defesa.

5. Salazar dissertava sobre a Europa e lamentava-se que os líderes europeus não se entendessem pois achava-os de pouca qualidade e estatura como estadistas, sem profundidade de conhecimentos políticos e sobretudo, nas suas palavras, sem o espírito de missão que qualquer Governante deve ter para servir o seu País.

6. A tua Mãe apartou-me da conversa e fomos para a biblioteca aonde nos sentámos confortavelmente. Transmiti-lhe os teus recados e ela muito se alegrou, nomeadamente com o nascimento do teu neto.

7. Disse-me também que acompanha com ternura os teus esforços brasileiros e que o teu Pai e ela estão seguros que serás bem-sucedido. Manda-te um grande beijo e pede-te que consigas saber “desligar” mais vezes do bulício diário e possas assim dedicar-te a tarefas mais do espírito do que da matéria. Achei-a muito bem e confessou-me que neste Natal tem a casa cheia de teus Avós e Bisavós de ambos os lados. O convidado de honra deste ano é o Avô El Cid “O Campeador”, o que os obrigou a refrescarem a memória para não fazerem gaffes.

8. Depois fui estar com a tua Avó materna que ficou também encantada pelo nascimento de mais um trisneto e tal como previas, por uns momentos e em silêncio ficou muito comovida e pediu-me para te dizer que cuides muito bem dele e que o protejas sempre.

Ela e o teu Avô, que entretanto apareceu, estavam muito contentes e orgulhosos e ele até me recomendou que lembres ao teu Filho para o pôr na esgrima um dia mais tarde e assim perpetuar a tradição familiar. Estavam muito entusiasmados com o jantar de Natal e com a presença inopinada do Campeador, pois o teu Avô tinha aí na terra lido tudo, na altura, sobre este herói e já tinha dado umas dicas aos teus Pais.

9. Finalmente, fui a casa do teu Avô paterno. Não sei se sabes que ele mora num sítio chamado “Guddem” igual ao da Índia aonde nasceu. O mesmo palácio, as mesmas terras, os mesmos palmares e ilha e o rio Mandovi a passar pela frente. É um sítio muito aprazível e com a tua Avó estavam ambos sentados numa enorme varanda e terraço que dava sobre o vale.

Disse-me para te transmitir que não deverias estar preocupado pois saberias como vencer os adversários. Ele sempre o soube: com tenacidade, com bravura, com vigor e obstinação e quando for preciso, não hesites em os afastar do caminho com frieza e pouca consideração.

Acrescentou que nada tem a ver com falta de bondade ou paciência ou inclusive menos tolerância: só que quem luta, ou vence ou morre e ele sabe que somos dos que vencem. Que leias umas memórias, um género de diário que ele te deixou e que conta como foi vencendo na sua vida, mas que o faças com desportivismo e como curiosidade intelectual.

Também se referiu ao jantar de Natal em casa dos teus Pais com o seu antepassado directo "o Cid, El Campeador". Estava a pensar levar na casaca (o teu Pai, parece que exigiu um traje formal para o receber e como só o Campeador é de outra geração, todos os teus Bisavós são do tempo da casaca) a Grã-Cruz de Isabel a Católica. Fica vistosa, traçada no colete e é um gesto de consideração pelo país do Avoengo.

Ficaram, ambos, muito vaidosos por mais um Noronha na Família e o teu Avô, sugere-te que lhe dês quando fizer 18 anos, uma réplica do seu anel de armas, que ele perdeu numa caçada ao elefante em África. A tua Avó, repetiu-lhe com ternura, que lhe estava, na altura, sempre a dizer que em África e sobretudo numa caçada se deviam dispensar tais vaidades, mas ele respondeu de novo, que o usava sempre desde que o tinha herdado.

Lembrou-te que há uma fotografia da tua Bisavó Maria do Carmo com este anel, antes de o ter passado e que tu sabes qual é, o que te permitirá mandares fazer uma cópia, na devida altura.

10. Finalmente e agora te digo eu, vou convidar vários dos nossos antepassados do lado da Avó Madalena de Bourbon, que sendo das famílias romanas de melhor estirpe deram alguns Papas à nossa dinastia.

11. Sei que passa aí uma série dos Bórgia: pois vê-a bem, pois na próxima missiva te contarei o que fizeram a alguns do nossos Avós. O maldito do espanhol! Já o vi por aqui e tenho uma conversa aprazada com ele. Sempre foi Papa e deixou um legado cultural impressionante.

Por hoje é tudo, meu querido Manuel. Sossega! Não se atribule o teu pensamento nem o teu coração. Goza a vida e os teus e verás como as aflições perdem a dimensão terrena que têm e sobem para o alto, perdendo-se nas nuvens.

Bonito poema o que me enviaste! Mas esqueceste-te que aqui temos uma outra visão sobre a vida e sobre a morte. A isto voltarei, apesar de já ter tratado anteriormente na nossa correspondência.

Vi na biblioteca da casa dos teus Pais, uma belíssima memória da imagem da Virgem do século XVI, que tens no teu monte. Perguntei-lhes porque a tinham e eles disseram-me que nunca se esqueceram como ela lá foi parar e contaram-me que estando tu num leilão há uns anos, e querendo comprá-la, vários outros interessados começaram a picar o preço. E parece que tu numa conversa sotto voce terás informado a candidata que se queria ir lá para casa, teria que parar naquele preço e nem mais um tostão! Os teus Pais, acharam de muito valimento este teu diálogo tendo surtido grande efeito. Mereceste essa lindíssima imagem!

Um afectuoso abraço do teu primo e amigo

Luis Bernardo

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