terça-feira, 11 de novembro de 2014

Volenti nihil difficile


Luís Bernardo, que já morrera, mantinha uma correspondência assídua com Manuel.

Eram da mesma Família e tinham-se conhecido com uma grande diferença de idades: ele sentenciado no processo dos Távoras, tendo sido simultaneamente traído pela Marquesa que andava de amores com o Rei.

Manuel, mais prosaicamente arrastava os seus dias neste penoso mundo, indagando com frequência do seu parente o que o esperava depois da morte. 

O correio chegava através de portadores que iam e vinham e depositavam as missivas na caixa de correio da casa de Manuel e quando este respondia a Luís Bernardo, era na Capelinha da Senhora do Monte que deixava as suas cartas, debaixo de uma laje que por lá havia e que se movia com facilidade deixando um buraco protegido da chuva e das intempéries.

Perguntado porque naquele sítio, Luís Bernardo respondera que a vista que dali se espraiava sobre a cidade deixava sempre os portadores maravilhados e que antes de empreenderem a viagem de regresso, dali miravam a beleza de Lisboa.

Manuel ainda foi ao miradouro várias vezes e nos dias aprazados para a entrega da correspondência. Tinha a expectativa de se poder encontrar presencialmente com os emissários de Luís Bernardo, mas esperou em vão, pois nunca ninguém apareceu, e quando antes de partir ia verificar se a carta tinha sido levada, ficava pasmado pois o buraco estava vazio e a carta desaparecera.

Um dia porém, resolveu deixar um envelope fechado com mais uma missiva e por cima pôs um pequeno papel com os seguintes dizeres em latim:— Volenti nihil difficile. (A quem quer, nada é difícil.)-

E passados uns dias encontrou uma resposta escrita no mesmo papel: —  Ave ataque vale  (Saudações e adeus.).

Sem comentários:

Enviar um comentário