domingo, 31 de outubro de 2010

estou cansado de gente


“Estou cansado, é claro,
Porque, a certa altura, a gente tem que estar cansado.

De que estou cansado, não sei:
De nada me serviria sabê-lo,
Pois o cansaço fica na mesma.

A ferida dói como dói
E não em função da causa que a produziu.

Sim, estou cansado,
E um pouco sorridente
De o cansaço ser só isto.

Uma vontade de sono no corpo,
Um desejo de não pensar na alma,
E por cima de tudo uma transparência lúcida
Do entendimento retrospectivo…
E a luxúria única de não ter já esperanças?

Sou inteligente; eis tudo.

Tenho visto muito e entendido muito o que tenho visto,
E há um certo prazer até no cansaço que isto nos dá,
Que afinal a cabeça sempre serve para qualquer coisa.”

Álvaro de Campos

1 comentário:

  1. Ainda não aprendi a aceitar o meu cansaço... e agora acho que anda ganhar proporções que exigem atenção!
    Vou "guardar" este poema. Procurá-lo na minha "biblioteca" e colocar nessa página um sinal bonito e colorido para "descansar"nele o olhar e lembrar-me do que tantas vezes digo a tanta gente e me esqueço de fazer comigo mesma!
    Abraço,
    Isabel

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