quarta-feira, 20 de abril de 2011

A música é capaz de reproduzir a dor que dilacera a alma e o sorriso que inebria


A música é capaz de reproduzir na sua forma real, a dor que dilacera a alma e o sorriso que a inebria. – Beethoven.

É impossível precisar quando surgiu a música, mas sabe-se que acompanha a história dos homens desde que os nossos antepassados perceberam que alguns objectos ao serem tocados emitiam sons, e dessa casualidade – e não apenas os sons da Natureza -, foi possível criar sons que podiam ser agradáveis ou não.

É um facto que desde que o homem passou a viver em sociedade, não houve nenhuma cultura onde não houvesse música. Nem mesmo os ascetas resistiram, pois veja-se a religiosidade de Bach, Vivaldi, Händel, entre tantos outros que pareciam criar o sonho celestial através da música.

Nietzsche e Schopenhauer, dois dos “espíritos” mais inquietantes da Filosofia, reconheciam na música um verdadeiro arrebatamento do Ser, e só a música era capaz de fazer corpo e “mente”, unidos, dançarem em perfeita sintonia.

Mas a música também pode representar tudo o que há de mais terrível e corruptível do Ser. Assim se expressou Nietzsche sobre o músico alemão Richard Wagner, após a rotura de uma amizade que pareceu nascer em belos jardins. Nietzsche rompeu com Wagner por entender que ele deixou de fazer música por prazer e passou a fazer ofertas de peças para ganhar popularidade, entre outros motivos, como a exaltação do nacionalismo alemão e a incorporação de elementos cristãos. Wagner passou a ser para Nietzsche um traidor da Arte representativa do existir: a arte trágica grega que afirmava a Vida.

Nesse contexto, evitando incorrer na ingénua pretensão de discutir géneros musicais, penso que seja possível captar de qualquer música uma linguagem universal.

A música que foi capaz de abraçar Nietzsche nos seus momentos de maior solidão e dor, a que fez até “quebrar” o pessimismo de Schopenhauer : é essa a música capaz de revigorar o Ser que diz Sim à Vida antes de qualquer exigência, tornando os obstáculos em meios para a criação e desenvolvimento.

Triste é ver que com a modernidade, como nunca antes, a música tem perdido o seu carácter trágico-grego. Quase que não existem grandes génios que buscam compreender a sua singularidade pela arte da música e que nos presenteiem com uma linguagem capaz de tocar as profundezas do Ser – os impulsos mais fortes e prazenteiros.

Pelo contrário, vejo a multiplicação de vozes e ruídos em histeria que, como hinos, entoam a negação da vida, ganhando aplausos entre a sádica alegria da embriaguez.

Em conjunto esses barulhos atordoam a singularidade existencial e glorificam uma moral de moda, de estética, de comportamento, de popularidade, de pensamento.

É no meio dessa histeria musical que se reproduz num ritmo impetuoso, que convido o meu leitor, mesmo quem nunca tenha “parado” para ouvir a “música arte”, a alimentar o seu Ser – corpo e intelecto juntos – com o banquete que Rachmaninov nos pode oferecer na Rapsódia sobre um tema de Paganini.

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