sábado, 22 de março de 2014

O dentista suíço do Príncipe de Sabóia, eu e as primeiras eleições em Angola - Parte I



O dentista suíço do Príncipe Victor Emanuel de Sabóia, foi convidado para jantar no mesmo dia do que eu naquela fantástica casa no Lac Léman, em Genève, que um arquitecto famoso desenhou para os Príncipes. Duas piscinas, uma interior de água quente, e uma outra para o lago, partindo do meio da sala com janelas amplas e com uma vista deslumbrante.

O recheio riquíssimo, com o acervo patrimonial dos Sabóias herdado do Rei Umberto (quadros, joias, pratas, serviços de loiça, móveis) e com presentes únicos e propositadamente feitos para a Casa Real por manufacturas italianas famosas, tais como um armário precioso de vidro de Murano, algumas peças em mármore de Carrara, etc.

Tudo disposto harmoniosamente e numa mistura de estilos, tornando as salas muito confortáveis e criando diversos espaços a vários níveis para se estar, sempre com vista para o jardim, para o pequeno ancoradouro e para o Lac Léman.

Uma carreira de tiro privada e uma colecção de armas priceless, uma garagem cheia de carros antigos (um Bugatti precioso dos primórdios) e várias motas.

Sempre lá fui acolhido com enorme grandeza mas também com a simplicidade da rotina raffiné do dia-a-dia. O staff compunha-se de um casal de portugueses emigrantes por mim indicado, um mordomo italiano, um “chauffeur” suíço e uma comida italiana sã, despretensiosa e uma delícia. Vinhos de grandes marcas e servidos com uma abundância preocupante para a coerência e lucidez das conversas….  

Avi era judeu e um afamado dentista frequentado por toda a boa e riquíssima sociedade local. Conheci-o numa aflição de umas dores de dentes danada quando estava com os Príncipes em Genève. Foi de uma enorme utilidade e amabilidade e tornámo-nos amigos. Todas as vezes que ia ter com os Príncipes, ou jantávamos todos fóra, sempre em excelentes bistrots, ou em casa dos Sabóias, ou de amigos; mas o que eu mais gostava era quando me convidava para comermos “perches” fritas, que eu adorava, junto ao Lac Léman, num restaurante famoso desta especialidade.

Antes do referido jantar, que sendo em “petit comité” ( O Príncipe, Avi e eu) convivemos com a Princesa Marina e com o Príncipe Emanuel Filiberto, jovem imberbe e loiro (aplica-se aqui a expressão que nem uma luva), simpático mas asneirento como seria de esperar de um filho único, rico e descendente de uma das maiores Famílias Reais da Europa. 

Ficámos finalmente os 3 à mesa e a conversa iniciou-se dizendo o Príncipe que o Avi (que naturalmente tinha ligações à Mossad) teria recebido instruções dos americanos para se sondar o Presidente angolano José Eduardo dos Santos, líder do MPLA, quanto a um eventual apoio dos EUA para candidato presidencial às primeiras eleições livres e democráticas que se realizariam em Angola, após a guerra civil. 

Tomando a palavra, Avi salientou que este assunto deveria ser tratado com a maior discrição, por todas as razões e sobretudo porque os americanos tinham sempre dado apoio a Jonas Savimbi e à UNITA.

A pergunta que me faziam era se eu conseguiria através dos meus contactos, proporcionar um encontro entre um grupo exclusivo e restrito (um embaixador americano nomeado pelo Presidente Bush – embaixador político – e mais umas quantas pessoas a posteriormente indicar) e o Presidente José Eduardo dos Santos.

Os EUA não tinham embaixada em Angola, por isso a missão tinha que ser super-confidencial e sem poder falhar, dado que na comitiva iria pela primeira vez um diplomata americano e com a situação explosiva em Luanda, apesar das tréguas, teriam que ser asseguradas medidas de protecção inequívocas. 

Foi ainda acrescentado pelo Avi que o Capitólio tinha autorizado uma firma de lobby, para financiar e preparar o apoio à campanha eleitoral angolana de dos Santos, se ele concordasse, e que me tinham escolhido como elemento de ligação pois sendo português e conhecendo Angola, pessoa da confiança do Príncipe e de Avi e com provas dadas de outras missões bem sucedidas, aportaria o “grano salis”, quando porventura se quisesse americanizar demais atitudes ou decisões que não se adaptassem à cultura angolana.

(continua)

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