À CONSIDERAÇÃO SUPERIOR
Alguém me dizia que as grandes datas
do catolicismo como o Natal e a Páscoa, precedidas respectivamente pelo
Advento e a Quaresma podem ser momentos de paragem e de reflexão da vida
de cada um.
Pouco importa o credo; entendo que se deve
periodicamente analisar o “curso das estrelas” da nossa vida, ainda que
sem ser de forma obsessiva e doentia, mas como meio de prevenção.
Até aqui nada de novo, por ser tão evidente e de senso comum.
Já quando metemos a mão bem fundo na nossa consciência o resultado é
outro. Varia de pessoa para pessoa, mas há sintomas comuns a pessoas
comuns. E é dessas que estamos a tratar agora.
Atingindo-se uma
idade a partir dos 60, quer por razões de menos operatividade, ou de um
corpo que se ressente de uma vida cheia e às vezes menos regrada, ou
mesmo de doenças crónicas, ou de crises financeiras pessoais ou do país
aonde se vive, para não falar de guerras, violência….assiste-se a um
decréscimo de entusiasmo pela vida e encara-se o futuro com algum
desencanto, senão mesmo desespero ou neurastenia, dependendo,
obviamente, de cada situação.
Por outro lado, para quem tem
famílias e descendentes, formam-se novos núcleos familiares e é habitual
que os filhos se dediquem mais intensamente às suas próprias vidas e da
dos seus do que à dos progenitores.
Cria-se assim um fosso
relacional entre várias gerações, sobretudo agudizado hoje em dia pelas
solicitudes da vida moderna, trazendo problemas àqueles que sendo mais
velhos, voltam a estar numa situação de carência de alguma protecção,
desvelo, atenção e assistência.
Verifica-se, nomeadamente em
Portugal, por falta de condições económicas e de apoio institucional do
Estado, a uma diminuição gritante da qualidade de vida e de bem-estar,
vulgo felicidade, que faz aumentar exponencialmente os suicídios, a
apatia, o desejo da chegada da morte e sem embargo, tantas vezes, de uma
eventual esperança de vida num número ainda significativo de anos que
poderia ser gozado de outra forma.
Será que não há nada a fazer?
Não tenho a certeza se as organizações/instituições e as pessoas que se
dedicam a estes problemas e que com tanta boa vontade, generosidade,
altruísmo e disponibilidade estão a cada dia a dar apoio a esta geração,
conseguem entender realmente o que é preciso para dar nova esperança e
ainda chegar a tempo de recuperar uma boa percentagem de gente
potencialmente válida e desejosa de desempenhar o seu papel na
sociedade.
Esmiucemos o que quero dizer com este último
parágrafo. Não falo daqueles que sem grande chama ou inteligência desde
quase sempre foram pessoas sem interesse ou cinzentas: para estes é
muito mais fácil fazer a transição e tornarem-se umas criaturas quase
vegetativas, com uma vida rotineira quase igual à anterior, não fora a
idade, a situação de reforma, ou alguma doença inibidora de alguma
actividade.
Refiro-me a quem pense, leia, escute e intervenha e
acompanhe o seu tempo, participando ainda pública ou privadamente na
sociedade civil, viajando, apreciando mais a natureza, frequentando
tertúlias intelectuais…
Estes são o contrapeso da irreflexão, da
imprudência na governação dos povos, da inexperiência sobre o bem e o
mal, do conforto na dor e na vivência da alegria. São preciosos
auxiliares na formação de netos e o recurso de filhos desorientados.
Naturalmente que este quadro mirífico que traço, nem sempre corresponde
a uma percentagem elevada de “qualificados”…mas em cada um de nós há
sempre uma parte mais pequena ou maior de todos estes ingredientes.
E se muitas vezes se queixam de um certo abandono a que por vezes são
votados na defesa “corporativa” dos seus interesses, é bem verdade que
se quiserem organizar-se e constituírem forças de pressão na sociedade,
mais fácil tornam o apuramento de novos caminhos e soluções.
Não
há hoje em dia, muita tolerância para um capital de queixa, dado que
actualmente na maioria dos países ditos civilizados, em regimes
democráticos, a iniciativa é totalmente livre e existem inclusive, meios
à disposição, assim fossem os interessados mais organizados.
Volto ao início do meu texto sobre os momentos necessários à interiorização.
Este é um tema que pode servir para ser proposto a quem de direito e no
actual momento, tendo nós um Presidente da República que deseja um
mandato de proximidade e afectos, bem faria em considerar este tópico
para um dos seus pilares de actuação como Presidente de todos os
Portugueses, pois abarca um número significativo de governados, com o
sentimento de alguma “orfandade”.
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