Eu acho que os leitores das minhas prosas ou versos, nunca
interpretarão o seu conteúdo da mesma maneira como eu as escrevi ou
senti. E têm razão, pois o tempo, o espaço, as minhas motivações, os
meus humores são indecifráveis, sobretudo quando o percurso temporal
entre a escrita, o envio e a publicação leva uns quantos dias!
Abrem-se
assim duas opções (i) escrever o que me apetece, dentro de limites
razoáveis (ii) antecipar as possíveis críticas, de agrado ou de censura e
moldar a minha escrita a um destinatário/a politicamente correcto mas
sempre imprevisível.
Vivi alguns anos fora de Portugal
em paragens longínquas em que as saudades apertavam, o cheiro das ruas e
a tranquilidade da paisagem me faltavam, e os familiares e os amigos
eram visitados só esporadicamente. Desatei a escrever e o resultado
foram umas largas centenas de cartas, as quais foram honradamente
reciprocadas. E juro que não eram repetidas a papel químico e cada uma
era escrita com emoção e intensidade.
Escrevia-as à noite, na tranquilidade do silêncio, normalmente acompanhado por música.
Tenho
para mim, ao contrário do correntemente aceite, que a noite não é tão
boa conselheira assim, pois exarceba os sentimentos. De manhã, relia-as e
muitas vezes deitava-as fora ou rescrevia-as, pois imaginava o carteiro
em Portugal, numa “triste, cinzenta e leda” manhã, deitar na caixa do
correio do destinatário/a uma missiva desenquadrada, causando-lhe a
maior perplexidade!
Como escrevo da forma que realmente
sinto e me sai, tratando-se de um prazer livre e independente de
grilhetas, o mais que pode acontecer é ir ficando a escrever para mim
próprio!
No dia em que morrer, se alguém vasculhar os
meus pertences, encontrará o que fui escrevendo, e logo dirá : “louco,
insano, destemido!”
Mas não é tão mais importante um grão de loucura do que ir direito para o Olimpo, sem mácula de ódios ou invejas!
MNA
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