quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

os meus votos de Natal aos meus reclusos na prisão de alta segurança



Não sei como falar-lhes do Natal quando para todos vocês é mais um dia na prisão em Monsanto sem as vossas famílias nem gozando da liberdade. Seria hipócrita desejar-lhes um Bom Natal no sentido estrito de uma festividade.

Mas sim, desejo-vos nesta quadra em que toda a gente parece ter-se aparentemente esquecido da maldade e mergulha no consumismo, e apregoa aos sete ventos votos de felicidade, repito, desejo-vos do coração um pouco mais de paz interior e também, se possível com o mundo que aqui vos rodeia.

Tinha proposto vir-vos visitar à cadeia na véspera de Natal e encher-vos de presentes, consolo, abraços e sorrisos, mas dizem-me que não posso. Mas queria que soubessem que pensarei em todos vocês, especialmente, na véspera e no próprio dia e que vos prometo que continuarei a fazer tudo ao meu alcance para vos tornar a vida mais suportável.

Tenho conversado com muita gente sobre esta minha experiência convosco e estou cada vez mais convencido que só ganhamos em serenidade, em realização de vida e felicidade se conseguirmos esquecer-nos de nós próprios e nos entregarmos ao bem dos outros, sem sentimentalismos nem pretensões, mas com verdade e exprimindo o que vai realmente no coração.

Vocês também são responsáveis pelo meu bem, por isso lhes peço que me ajudem a encontrar em vocês um estímulo para poder acreditar que estamos em conjunto num desafio de recomeçarmos uma nova etapa das vossas vidas. Cada um com as suas luzes e sombras, com o seu passado, mas sobretudo com o desejo firme de voltar a acreditar que têm um futuro à vossa frente e que o êxito para que seja o melhor, passa e depende muito de cada um.

Já nos compreendemos bem nestes meses de convívio e ensino do português e sabem que não sou de vos pregar lições de moral. Respeito-os e aceito-os como me foram colocados na minha vida e tento com simplicidade e amizade transmitir-lhes que há outras hipóteses e opções para o vosso percurso. Sei que estão atentos e que me vão escutando e sobre tudo vamos conversando com liberdade de opinião.

O vosso sofrimento e restrições a uma vida normal no exterior, com as vossas famílias e amigos, são um bom meio para a reflexão e para a mudança.

Irão sair com mais sabedoria, com mais capacidade de ponderar cada uma das vossas futuras atitudes, para o bem e para o mal. Assim, saibamos todos, estender-vos as mãos e proporcionar-lhes a ajuda e um pequeno empurrão para vos lançardes ao caminho.

Com este meu abraço a cada um, mesmo que seja na frente dos guardas, que fiquem na certeza que podem contar comigo, como eu tenho a certeza de que não me deixarão mal.


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