quarta-feira, 12 de junho de 2013

"Histórias Parvas" de Rogério Pires de Carvalho

Meu Caríssimo Rogério,

Recebi com o maior desvelo mais um livro teu, que denominaste de "Histórias Parvas", e que te agradeço pela lembrança.

A ele dedicarei em breve um tempo especial para o ler.

Explico: o Rogério que eu conheci, nem digo bem há quantos anos, no Liceu Pedro Nunes, continua a povoar as minhas memórias. Boas memórias, de deleite e enorme prazer intelectual.

Foi contigo e com o Pedro Cabral Magalhães que sentados no sótão dele, passávamos horas a ouvir deliciados o Pedro a declamar poesia, a lermos em voz alta renomados escritores, a conversarmos sobre tanta coisa.

Era um sótão clandestino aonde aprendi a conhecer e a amar os grandes autores, a ouvir outras ideias novas para mim, sobre política, sobre religião, sobre vidas e formas de viver, sobre revolta e resignação, sobre como aprender a crescer para fora do ambiente estreito aonde era educado, sem lhe tirar o mérito que tinha. 

E curiosamente, tu eras o meu professor em matérias desconhecidas...mas com uma enorme doçura e até timidez, aliada a profundidade e reflexão no que dizias. Sem ferir para fóra, com respeito e desacordo e também curiosidade por realidades diferentes de pensamento e de hábitos.

Lembro-me um dia, perguntares como era a minha vida em minha casa e eu ter-te convidado a ir lá estudar ao meu quarto e aí permaneceste e ao jantar conviveste com os meus Pais e 7 irmãos e irmãs, que iam e vinham....afinal não eram ogres!

E quando, mais tarde continuámos a conversar sobre tanta coisa que viria a ser premunitório das transformações que se operaram no 25 de Abril, havia uma coisa, em particular, que tu me dizias e que sentia que te fazia falta: achavas que eu era feliz e tinha uma família feliz.

Era bem verdade e sentia-se naturalmente no meu comportamento: mérito de uma só coisa - os meus Pais amavam-se e amavam com intensidade os seus Filhos - e isso tem um preço incalculável e um retorno e consequências de solidez para o futuro, aconteça o que acontecer.

Tanto de que poderíamos falar, visitando esses tempos de uma certa irresponsabilidade e de juventude. Tudo passa.

No entanto, permanece sempre em mim algo que me é inato: o doce sabor da liberdade!

O sabor de poder pensar livremente como eu quero, sei, ou tento escrever o que me vai no íntimo.

Por isso, tenho a certeza que o teu livro me fará ainda mais recordar-te da maneira como me apetece fazê-lo: o de um grande Amigo que além de bem escrever, se reencontra no tempo comigo na vivência de tantas "Histórias Parvas"!

Um grande abraço muito amigo do

Manuel

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