Meu Caríssimo Rogério,
Recebi com o maior desvelo mais um livro teu, que denominaste de "Histórias Parvas", e que te agradeço pela lembrança.
A ele dedicarei em breve um tempo especial para o ler.
Explico: o Rogério que eu conheci, nem digo bem há quantos anos, no
Liceu Pedro Nunes, continua a povoar as minhas memórias. Boas memórias,
de deleite e enorme prazer intelectual.
Foi contigo e com o Pedro
Cabral Magalhães que sentados no sótão dele, passávamos horas a ouvir
deliciados o Pedro a declamar poesia, a lermos em voz alta renomados escritores, a
conversarmos sobre tanta coisa.
Era um sótão clandestino aonde aprendi a conhecer e a amar os
grandes autores, a ouvir outras ideias novas para mim, sobre política,
sobre religião, sobre vidas e formas de viver, sobre revolta e
resignação, sobre como aprender a crescer para fora do ambiente estreito
aonde era educado, sem lhe tirar o mérito que tinha.
E curiosamente, tu eras o meu professor em matérias
desconhecidas...mas com uma enorme doçura e até timidez, aliada a
profundidade e reflexão no que dizias. Sem ferir para fóra, com respeito
e desacordo e também curiosidade por realidades diferentes de
pensamento e de hábitos.
Lembro-me um dia, perguntares como era a minha vida em minha casa e
eu ter-te convidado a ir lá estudar ao meu quarto e aí permaneceste e ao
jantar conviveste com os meus Pais e 7 irmãos e irmãs, que iam e vinham....afinal
não eram ogres!
E quando, mais tarde continuámos a conversar sobre tanta coisa que
viria a ser premunitório das transformações que se operaram no 25 de
Abril, havia uma coisa, em particular, que tu me dizias e que sentia que te fazia falta:
achavas que eu era feliz e tinha uma família feliz.
Era bem verdade e sentia-se naturalmente no meu comportamento: mérito de
uma só coisa - os meus Pais amavam-se e amavam com intensidade os seus
Filhos - e isso tem um preço incalculável e um retorno e consequências
de solidez para o futuro, aconteça o que acontecer.
Tanto de que poderíamos falar, visitando esses tempos de uma certa irresponsabilidade e de juventude. Tudo passa.
No entanto, permanece sempre em mim algo que me é inato: o doce sabor da liberdade!
O sabor de poder pensar livremente como eu quero, sei, ou tento escrever o que me vai no íntimo.
Por isso, tenho a certeza que o teu livro me fará ainda mais
recordar-te da maneira como me apetece fazê-lo: o de um grande Amigo que
além de bem escrever, se reencontra no tempo comigo na vivência de
tantas "Histórias Parvas"!
Um grande abraço muito amigo do
Manuel
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