Meu Querido Manuel,
Gostei da tua última
carta que me fez lembrar o meu próprio casamento. Também
eu senti pela minha noiva, a minha Tia paterna mais nova, um enorme amor desde o
princípio.
Nascemos ambos em Agosto e
tínhamos por isso a mesma idade.
Portugal era palco de um
vasto conjunto de reformas com o objectivo de sair da miséria na qual mergulhara
devido à diminuição das remessas de ouro recebidas do Brasil.
Debaixo deste cenário, e
face às novas políticas mercantilistas que surgiram do pensamento iluminista
que ignoravam a estrutura nobiliárquica privilegiando uma lógica de poder
economicista, a nobreza portuguesa ficou bastante descontente com o governo do Rei D.José I.
A nossa Família estava
contra estas mudanças, pois era possuidora de uma enorme fortuna e da nossa
história constavam vários serviços prestados aos diversos Reis de Portugal ao
longo dos séculos.
Em Setembro desse ano, o
meu Pai tinha acabado de regressar da Índia, onde tinha sido Vice-Rei, e
assumiu-se como o porta-voz da discórdia dos nobres e da oposição política às
reformas do primeiro-ministro.
Por isso, Sebastião José
odiava a nossa família.
Passámos anos felizes e o
nosso amor foi crescendo, mas a vida da Côrte era traiçoeira e os Reis tinham
esse triste hábito de perturbar as vidas dos casais felizes, apaixonando-se por
mulheres casadas. A Tereza era formosa, muito alegre e culta e divertia o Rei.
A partir de uma certa
altura, passei a vê-la pouco a não ser quando íamos ao Paço, que estava instalado numas tendas reais fóra de portas, pois o Rei temia que os abalos do
terramoto se repetissem.
Tereza, dançava muito com todos e
em especial com o Rei e reparei que a afeição que ao princípio tinha por mim,
esfriara e de mulher dócil e prazenteira, passou a frívola e cortesã.
Ocupava o meu tempo nos
afazeres do cargo e na administração dos bens familiares e ela tinha uma vida própria.
Passámos a dormir em quartos separados e eu sabia que entrava tarde muitas
vezes, pois ouvia o barulho dos cavalos e da carruagem a chegar a altas horas.
Havia rumores de que era
amante do Rei, mas eu confrontei-a várias vezes e sempre o negou e eu
conformava-me em achar de que não era mais do que uma mera aceitação da corte por parte do
Rei.
Depois da minha morte,
supliciado que fui no cadafalso, ela nada sofreu, sendo apenas encerrada no Convento
das freiras do Rato, talvez com a ideia de em breve a soltarem, mas o Rei,
parece que depressa se esqueceu dela, pois no Convento passou o resto da vida, morrendo
em profunda miséria.
Triste carta esta que te
escrevo a propósito das tuas considerações, meu Caro Manuel.
Um desditoso abraço do teu primo
Luís Bernardo
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