quinta-feira, 30 de janeiro de 2014
quinta-feira, 23 de janeiro de 2014
quarta-feira, 22 de janeiro de 2014
O psiquiatra - Um breve conto (continuação)
Luís acordou estremunhado
e olhou para o relógio, preocupado pelo decorrer das horas.
Tinha consultas no
Hospital, pois já era psiquiatra de facto há vários anos e tudo isto não passou
de um sonho que teria que interpretar quando tivesse tempo.
A sua vida era muito bem
preenchida com tudo aquilo que gostava de fazer e por isso um certo travo
amargo ficara-lhe na boca…porque raio havia de lhe ter ocorrido todo este
enredo?
Saiu apressado para
apanhar o carro e quando entrou, verificou que tinha um pequeno bilhete dobrado
no para-brisas.
- Que maçada, uma multa!
E pegou no papel e verificou que era branco e que dentro teria alguma coisa
escrita.
- Leio mais tarde, pois
estou cheio de pressa! E meteu o papel no bolso.
No intervalo das
consultas e enquanto o paciente seguinte não entrava, foi buscar o papel ao
casaco e ao abri-lo teve a maior das surpresas.
Tinha escrito, em letra firme de tinta preta uma pequena mensagem que dizia assim:
“ Espero-te logo para
jantar. Liga para o 919445673 que é o número do porteiro do prédio para te abrir a porta.
S.”
Seria o Seixas, seu amigo
e colega de Hospital que andava com uns problemas e que lhe tinha dito que
gostava de desabafar?
Seria possível que fosse
a Sandra do sonho?
Mais tarde ligaria, pois
a enfermeira acabava de lhe abrir a porta para dar entrada no seu gabinete a um
novo paciente.
Os braços eram somente feitos de nuvens
Um dia compreendeu como os seus braços eram somente feitos de nuvens.
Impossível com nuvens abraçar até ao fundo um corpo, uma sorte.
A sorte é redonda e conta lentamente as estrelas do estio.
Fazem falta uns braços seguros como o vento,
E como o mar um beijo.
Mas ele com os seus lábios, com os seus lábios não sabe dizer senão palavras, palavras até ao tecto, palavras até ao solo.
E os seus braços são nuvens que transformam
a vida em ar navegável.
Luis Cernuda
terça-feira, 21 de janeiro de 2014
Pensamentos
Did you know the people that are
the strongest are usually the most sensitive?
Did you know the people who
exhibit the most kindness are the first to get mistreated? Did you know the one
who takes care of others all the time are usually the ones who need it the
most?
Did you know the 3 hardest things
to say are I love you, I'm sorry, and Help me.
Sometimes just because a person
looks happy, you have to look past their smile and see how much pain they may
be in.
From life
From life
segunda-feira, 20 de janeiro de 2014
O psiquiatra - Um breve conto (continuação)
Sandra reparara em Luís
quando lhe anunciaram que ia ser ele, o seu interlocutor.
Achara-o giro e sensual e
de imediato decidira que o havia de encantar e deslumbrar, e para isso
preparava cuidadosamente a sua “história”, ou seja o papel que incarnava e o
perfil de “paciente” virtual.
O seu objectivo era
claro: queria-o na cama e depressa nem que para isso tivesse que usar de todo o
seu charme e persuasão.
Escolhera com critério a
roupa que ia usar: uma tee-shirt de fina popelina branca entreaberta deixando
ver duas “maçãs” roliças e com bicos pontiagudos, pois iria sem soutien, o que
normalmente atraía a atenção de toda a gente.
Levaria por cima um pullover
em v, de cachemira beije, de toque impressionantemente macio e umas calças apertadas e
justas ao corpo, de pelica castanha, moldando um traseiro bem torneado.
Calçaria uns sapatos de salto alto deixando ver um pé bem feito e harmonioso.
Se pudesse, em algum
momento, apetecia-lhe beijá-lo loucamente com a sua boca fogosa e enlaçá-lo
atraindo-o para os seus braços, inebriando-o com o seu perfume fresco e
irresistível.
Tentaria revelar-se uma
vadia e insaciável “valquíria” pois o “papel” de esposa insatisfeita assim o
sugeria.
Tinha, porém, algum receio de que
Luís pudesse achá-la uma desavergonhada e atrevida, mas começaria por anunciar
em voz alta que tudo quanto ali fizesse ou dissesse, não correspondia ao seu
verdadeiro eu.
No fundo, por prudência,
preferia salvaguardar-se e até desempenhar a função de uma excelente “actriz” representando o
seu papel, de acordo com o “guião”.
Luís, por seu lado,
cogitava em como poderia aprofundar mais a verdadeira personalidade da “paciente”
e gostaria que depois do seu “espectáculo” pudesse guardar alguma cumplicidade
com a “modelo” da sua experiência.
Luís era muito atreito às
tentações e resistia-lhes pouco e quando provocado com sensualidade e subtileza,
gozava muito mais do que com vulgaridades.
Sucumbia à sedução mais pela mente combinada com o físico, do que só pelo instinto sexual. Era importante
para ele ter alguém que fosse capaz de lhe fazer despertar os sentidos e aí,
sim, mergulhava irresistivelmente no desfrute completo do prazer e tornava-se o
parceiro ideal.
(continua)
Vem por aqui
Vem por aqui" — dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...
A minha glória é esta:
Criar desumanidades!
Não acompanhar ninguém.
— Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe
Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?
Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...
Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.
Como, pois, sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...
Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tetos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...
Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém!
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.
Ah, que ninguém me dê piedosas intenções,
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!
José Régio, Cântico Negro
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...
A minha glória é esta:
Criar desumanidades!
Não acompanhar ninguém.
— Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe
Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?
Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...
Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.
Como, pois, sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...
Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tetos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...
Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém!
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.
Ah, que ninguém me dê piedosas intenções,
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!
José Régio, Cântico Negro
domingo, 19 de janeiro de 2014
o Motel
Mirtes não se agüentou e contou para a Lurdes:
- Viram teu marido entrando num motel.
A Lurdes abriu a boca e arregalou os olhos..
Ficou assim, uma estátua de espanto, durante um minuto, um minuto e meio.
Depois pediu detalhes.
- Quando? Onde? Com quem?
- Ontem. No Discretíssimu's.
- Com quem? Com quem?
- Isso eu não sei.
- Mas como? Era alta? Magra? Loira?
Puxava de uma perna?
- Não sei, Lu.
- Carlos Alberto me paga. Ah, me paga.
Quando o Carlos Alberto chegou em casa a Lurdes anunciou que iria deixá-lo e contou por quê.
- Mas que história é essa, Lurdes?
Você sabe quem era a mulher que estava comigo no motel.
Era você!
- Pois é. Maldita hora em que eu aceitei ir.
Discretíssimu's! Toda a cidade ficou sabendo. Ainda bem que não me identificaram.
- Pois então?
- Pois então, que eu tenho que deixar você. Não vê?
É o que todas as minhas amigas esperam que eu faça. Não sou mulher de ser enganada pelo marido e não reagir.
- Mas você não foi enganada. Quem estava comigo era você!
- Mas elas não sabem disso!
- Eu não acredito, Lurdes! Você vai desmanchar nosso casamento por isso? Por uma convenção?
- Vou!
Mais tarde, quando a Lurdes estava saindo de casa, com as malas, o Carlos Alberto a interceptou.
Estava sombrio: Acabo de receber um telefonema - disse.. Era o Dico.
- O que ele queria?
- Fez mil rodeios, mas acabou me contando. Disse que, como meu amigo, tinha que contar.
- O quê?
- Você foi vista saindo do motel Discretíssimu's ontem, com um homem.
- Mas o homem era você!
- Eu sei, mas eu não fui identificado.
- Você não disse que era você?
- O quê? Para que os meus amigos pensem que eu vou a motel com a minha própria mulher?
- E então?
- Desculpe, Lurdes, mas...
- Mas o quê?
- Vou ter que te dar uma surra...
Luiz Fernando Veríssimo
MORAL DA HISTÓRIA:
DEVEMOS CUIDAR APENAS DA NOSSA SAÚDE, POIS DA NOSSA VIDA, TODO MUNDO CUIDA...
- Viram teu marido entrando num motel.
A Lurdes abriu a boca e arregalou os olhos..
Ficou assim, uma estátua de espanto, durante um minuto, um minuto e meio.
Depois pediu detalhes.
- Quando? Onde? Com quem?
- Ontem. No Discretíssimu's.
- Com quem? Com quem?
- Isso eu não sei.
- Mas como? Era alta? Magra? Loira?
Puxava de uma perna?
- Não sei, Lu.
- Carlos Alberto me paga. Ah, me paga.
Quando o Carlos Alberto chegou em casa a Lurdes anunciou que iria deixá-lo e contou por quê.
- Mas que história é essa, Lurdes?
Você sabe quem era a mulher que estava comigo no motel.
Era você!
- Pois é. Maldita hora em que eu aceitei ir.
Discretíssimu's! Toda a cidade ficou sabendo. Ainda bem que não me identificaram.
- Pois então?
- Pois então, que eu tenho que deixar você. Não vê?
É o que todas as minhas amigas esperam que eu faça. Não sou mulher de ser enganada pelo marido e não reagir.
- Mas você não foi enganada. Quem estava comigo era você!
- Mas elas não sabem disso!
- Eu não acredito, Lurdes! Você vai desmanchar nosso casamento por isso? Por uma convenção?
- Vou!
Mais tarde, quando a Lurdes estava saindo de casa, com as malas, o Carlos Alberto a interceptou.
Estava sombrio: Acabo de receber um telefonema - disse.. Era o Dico.
- O que ele queria?
- Fez mil rodeios, mas acabou me contando. Disse que, como meu amigo, tinha que contar.
- O quê?
- Você foi vista saindo do motel Discretíssimu's ontem, com um homem.
- Mas o homem era você!
- Eu sei, mas eu não fui identificado.
- Você não disse que era você?
- O quê? Para que os meus amigos pensem que eu vou a motel com a minha própria mulher?
- E então?
- Desculpe, Lurdes, mas...
- Mas o quê?
- Vou ter que te dar uma surra...
Luiz Fernando Veríssimo
MORAL DA HISTÓRIA:
DEVEMOS CUIDAR APENAS DA NOSSA SAÚDE, POIS DA NOSSA VIDA, TODO MUNDO CUIDA...
sábado, 18 de janeiro de 2014
O psiquiatra - Um breve conto (continuação)
Ruby Kamara, um africano
da Costa do Marfim, fora colega de Luís na Universidade e também se licenciara
em medicina, nomeadamente em psiquiatria.
Chegara sem conhecer
ninguém e Luís vendo-o um pouco perdido, deu-lhe apoio e tornaram-se os
melhores amigos. Passado algum tempo aprendeu com esperteza a falar português e
começou a dar-se com todos os colegas.
Era um tipo catita, bem-parecido
e foi-se adaptando com facilidade ao meio universitário português.
Estudavam juntos e no
sótão da casa de Luís, ouviam música, falavam de arte e de história durante
horas, e à medida que crescia a amizade entre eles, Ruby foi-se abrindo e
dizendo a Luís que gostava que um dia ele experimentasse umas ervas típicas da
sua terra que faziam sonhar e davam mais pica para o estudo.
Luís perguntou-lhe de
caras se ele achava que era ingénuo e não sabia do que se tratava. Com grande
espanto seu, Ruby respondeu-lhe que se utilizavam nas sessões de espiritismo africano
na terra dele e que eram ervas que os feiticeiros davam aos presentes para
falarem com os ausentes.
Nada convencido Luís foi
disfarçando até que um dia, tendo pela frente milhares de páginas para estudarem
pela noite fora, Ruby propôs-lhe que tomassem uma porção de “khat” para
estimular a concentração.
Assim fizeram e no dia
seguinte apesar de a prova ter corrido às mil maravilhas aos dois, estavam como
se lhes tivesse passado por cima uma retroescavadora.
Ruby contou-lhe que quando
morria alguém na sua aldeia natal, se reuniam numa clareira no meio da
floresta, num local secreto com o corpo do morto jazendo num toro de árvore
liso e muito bem polido, envolto num pano branco tecido com raízes de plantas
que formavam como um lençol fino.
Começavam as danças e o
feiticeiro distribuía porções de “khat” pelos presentes e passadas algumas
horas o corpo levitava e voltava à vida ou se tinha que morrer definitivamente
eram chamados os espíritos para o virem buscar.
Luís achava a descrição
curiosa mas dizia-lhe que tudo quanto Ruby contava que via (a levitação e a ressurreição)
eram fruto dos efeitos do “khat”. O africano negava e jurava que era tudo verdade.
Foram progredindo no curso
e Luís cada vez mais se habituara a tomar “khat” a pretexto de tudo e de nada.
O “khat”, como Luís bem sabia, contém o
alcalóide chamado catinona, um estimulante similar à anfetamina, que causa
excitação e euforia e que produz uma dependência psicológica.
Luís nas aulas estava algumas
vezes de ressaca de “khat” e reparara que os efeitos se prolongavam durante
parte do dia, nomeadamente no momento em que tinha que falar em público, distorcendo-lhe
os sentidos e confundindo o cérebro e afectando os pensamentos e a comunicação.
Luís estudara que as
drogas alucinogénias, no plano das interpretações psicológicas ou
psicanalíticas se situam entre os fenómenos de modificação das emoções e
personalidade, superficialmente descritas como uma relação entre o ego e o
mundo exterior/interior, análogo às interpretações que se dá aos efeitos do transe
das religiões de “possessão” africanas.
Começou a ter medo desta
habituação e via que Ruby era muito mais moderado e que até já o tinha avisado
dos prejuízos que lhe poderia causar tal dependência.
Luís, no entanto, decidiu
que na pretensa “consulta” com Sandra, uma vez que era perante todos os seus
colegas e que desejava obter uma boa nota e impressionar o professor com a sua
argúcia, tomaria uma dose de “khat” de manhã antes de ir para a Faculdade.
(continua)
sexta-feira, 17 de janeiro de 2014
era um grande gajo este Luis Vaz....metia num chinelo o PPC e o PP...
era um grande gajo este Luis Vaz....metia num chinelo o PPC e o PP...aahahahah
Que dias há que na alma me tem posto
um não sei quê, que nasce não sei onde,
vem não sei como, e dói não sei porquê.
Luís Vaz de Camões
quarta-feira, 15 de janeiro de 2014
Promoção no Sporting para comprar novos jogadores...carpélio verde!
Por necessidade de fundos, o Sporting está a promover este magnífico carpélio verde! E não é que é jeitoso...
Se eu pudesse trincar a terra toda
Se eu pudesse trincar a terra toda
E sentir-lhe um paladar,
Seria mais feliz um momento ...
Mas eu nem sempre quero ser feliz.
É preciso ser de vez em quando infeliz
Para se poder ser natural...
Nem tudo é dias de sol,
E a chuva, quando falta muito, pede-se.
Por isso tomo a infelicidade com a felicidade
Naturalmente, como quem não estranha
Que haja montanhas e planícies
E que haja rochedos e erva ...
O que é preciso é ser-se natural e calmo
Na felicidade ou na infelicidade,
Sentir como quem olha,
Pensar como quem anda,
E quando se vai morrer, lembrar-se de que o dia morre,
E que o poente é belo e é bela a noite que fica...
Assim é e assim seja ...
Alberto Caeiro, in "O Guardador de Rebanhos - Poema XXI"
Heterónimo de Fernando Pessoa
E sentir-lhe um paladar,
Seria mais feliz um momento ...
Mas eu nem sempre quero ser feliz.
É preciso ser de vez em quando infeliz
Para se poder ser natural...
Nem tudo é dias de sol,
E a chuva, quando falta muito, pede-se.
Por isso tomo a infelicidade com a felicidade
Naturalmente, como quem não estranha
Que haja montanhas e planícies
E que haja rochedos e erva ...
O que é preciso é ser-se natural e calmo
Na felicidade ou na infelicidade,
Sentir como quem olha,
Pensar como quem anda,
E quando se vai morrer, lembrar-se de que o dia morre,
E que o poente é belo e é bela a noite que fica...
Assim é e assim seja ...
Alberto Caeiro, in "O Guardador de Rebanhos - Poema XXI"
Heterónimo de Fernando Pessoa
sábado, 11 de janeiro de 2014
A Coroação de Napoleão, por David...o logro
Estou aqui no meu escritório sozinho, a trabalhar.
Estamos no princípio da tarde do último dia do ano de 2013. Estou
a ouvir música, que vai desde os “Band of Horses”, “The XX”, “LCD Soundsystem”,
“The Cure”, “Radiohead”, “Kings of Convenience”, “Fascinação” de Ellis Regina,
Caetano Veloso, Tom Jobim, “Sevillanas de Oro”, Amalia, Pavarotti, duas das
minhas divas – a Callas e a Kiri Te Kanawa – e a Rádio Marginal e um bom
calorífero aceso.
Fiz um rápido périplo pelo ano que passou e a conclusão não
foi positiva. Não vale a pena enganar-nos: mais impostos, menos oportunidades,
país pior, mais gente burlona vivendo à nossa custa, para apagar da memória.
Também o que entra não me aparece risonho, mas estou farto
de cenários e comentadores e previsões.
Na caixa do supermercado o que conta é
o dinheiro na mão! É aí que tenho que apostar: trazer no final de cada mês o
suficiente para uma vida digna e tão equilibrada quanto possível.
Os negócios fóra de Portugal, o trabalho árduo e difícil
ainda a realizar é o sonho bom, no que vale a pena apostar e o que dá o
conforto para acreditar que enquanto tivermos capacidade para nos reinventar e
labutarmos, a vida tem sentido.
Sinto uma espécie de vazio – não sei se me consigo exprimir – a neura do inexistente que me invade e que decerto deve
estar bem presente em tantas e tantos que logo celebrarão enganosamente e com
atordoamento a chegada do novo ano.
Por isso, portuguesas e portugueses…ridícula forma com que
os nossos políticos nos brindam nos seus discursos, apanhem uma grande
bebedeira, esqueçam que existem problemas por uns momentos e atinjam o nirvana
mesmo à meia-noite, pois a ressaca será danada e não é só na manhã do dia
seguinte.
Join me in the clouds…há lá lugares ainda livres no hospício
para loucos. Encontrar-me-ão fazendo de Ícaro com asas de cêra, caindo de nuvem
em nuvem ou como Napoleão, comandando tropas.
Confesso que há na personagem de Bonaparte alguns pormenores
que me fazem ter a percepção de como homens geniais perdem essa característica
quando se sentem cheios do sucesso: no célebre quadro da coroação, por David, há
um balcão imperial em que aparece destacada “Madame Mére” ou seja Letícia Ramolino
Bonaparte, em trajes de gala e sabem que não esteve lá nem presenciou a
cerimónia?
Por onde andará o Dias Loureiro? Ou o Miguel Relvas? Li,
que no renovado Copacabana Palace no Rio, a US$ 600 por noite. Estive lá a
tomar no bar, um sumo de tomate recentemente, custou-me uns quaisquer
reais.
Bandidos!
Mau ano para eles todos e que ou devolvam o
dinheiro que roubaram e o que nos roubam ou acabem com os ossos na enxovia.
quinta-feira, 9 de janeiro de 2014
O psiquiatra - Um breve conto (continuação)
Luís, preparara-se para o
debate na aula e tinha feito algumas reflexões sobre como abordar as premissas
genéricas que lhe tinham sido fornecidas.
Quanto à insatisfação
sexual pela não eventual fogosidade do companheiro, e uma vez que o dito não estaria
presente, as perguntas seriam mais no sentido de apurar o que a paciente
considerava como patamares aceitáveis de desempenho. Escarafunchar ao detalhe,
fazendo-a confessar prazeres ocultos e desejos lúbricos.
Muitas vezes há falta
de diálogo neste campo, e a parte negligenciada nem sonha como
agradar verdadeiramente, porque ou há um certo pudor da outra em desvendar o
seu interior profundo, ou porque pura e simplesmente se cumpre um ritual sem
mais e se dá como dado adquirido que se fez a escolha errada e sem esperança de
conserto. Outras razões haverá, mas que Luís não considerava aplicáveis à primeira vista, neste caso.
Normalmente este tipo de rotina conduz à
infidelidade, ou seja tomar-se garboso cavaleiro que monte a garupa sem freio!
De acordo com as notas
providenciadas, existia aparentemente uma ansiedade e sensação de desconforto pelas
traições. Luís considerava que as causas teriam que ser investigadas para apurar-se se seriam
reais.
Tudo dependeria das
respostas a um escrutínio mais alargado sobre os seus princípios morais, sobre
a formulação e definição de culpa, de uma maior ou menor aceitação de liberalidade
nos padrões de conduta sexual.
Haveria que escrutinar o passado familiar, a vivência
antes da relação, alguns pormenores ou historietas mais salientes que neste
campo se tivessem passado. No fundo caberia analisar qual o grau de desconformidade
que a paciente demonstrava em relação ao que considerasse o padrão base de
referência moral para si própria.
Luís tinha alguma
curiosidade em “fazer falar” a pretensa paciente, não só por ser uma prova pública
dos seus méritos profissionais pelo convencimento da sua argumentação o que lhe
valeria uma boa classificação, mas também porque sinceramente lhe interessava o
estudo dos “outros”.
Havia quem fosse “bird watcher” ou encantador de serpentes,
outros ou outras cuscos e gostando de falar sobre a vida fútil de terceiros,
ainda uns quantos misóginos ou exuberantes.
Mas para Luís, cada vez
se consolidava mais na sua mente, o desejo de escolher a especialidade de psiquiatria.
Para além da sua personalidade que revelava uma certa dose de bondade e altruísmo, possuía o dom de
uma intuição rara, que pretendia apurar e desenvolver.
O contacto com os outros
era uma fonte inesgotável de prazer para si, e o facto de poder mergulhar no
âmago das suas naturezas e perscrutar os comportamentos, as emoções, o
rationale de atitudes tantas vezes inesperadas e imprevistas, em suma a
verdadeira “condição humana” na acepção de Voltaire, tornava-se um deleite
inultrapassável em termos profissionais.
Por isso, sendo alegre e
divertido e fazendo muito sucesso nos ambientes em que se movimentava, era um
constante observador das atitudes que presenciava de mil e uma pessoas com diversos
comportamentos.
E este acumular de experiências ia constituindo um valioso capital
que presumia, o tornaria num psiquiatra de sucesso e confiável.
Tinha um ponto fraco,
porém, que temia lhe pudesse estragar a estabilidade emocional que lhe era
requerida.
(continua)
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