quinta-feira, 14 de outubro de 2010
o silêncio de Agustina
Em 1959, Agustina foi convidada a participar num congresso em Aix-en-Provence sob o tema geral - o destino da Europa - com grandes figuras da literatura europeia. Posteriormente, publicou um livro em que descreve a viagem por Espanha, França e Itália, uma espécie de diário com reflexões preciosas sobre diversas questões, entre elas, o silêncio.
No dia em que ia ser discutido o problema da técnica, Agustina diz das suas impressões muito bem-humoradas sobre alguns participantes que vão aparecendo na sala ao mesmo tempo que distribui sorrisos já sentada numa cadeira rústica pintada de azul-claro. Escreve de como é difícil alguém conservar a dignidade intelectual sentada numa cadeira tão ingénua, mas é a que ela escolhe. Ainda uma vez fala de convívio e de silêncio.
"Entre uma multidão que se interpela, que se exprime afanosamente, que se chama à distância, que se abre em aberrantes votos de confiança, que se oferece, que se interessa, que arma pavilhões e convida amigos e desperta vizinhos, encontrar alguém que está calado e permite que façamos a respeito dele suposições erradas e fantásticas – isso é como descobrir a pedra filosofal. Para o diabo o mundo elástico das boas intenções, as campainhas no pescoço do belo senso; para o diabo os sindicatos da simpatia, o quase entendimento, a meia-verdade, o saltinho sobre o ombro da minúscula razoabilidade! Fechem as máquinas de falar, desandem os botões da verbosidade, façam má cara aos visitantes, despeçam os oradores oficiais, cancelem o contrato dos conferencistas. Silêncio, silêncio… Escondam o rosto um momento, desçam as cortinas, preguem as janelas, chorem, se quiserem, mas silêncio! Dai tempo a ouvir um anjo que passa, uma cigarra que canta, uma pedra que rola, uma flor que morre. Também isto é sério, também isto é justo, também isto é revelação, e caridade, e inteligência. Dai tempo a vós próprios, que sois vivos e que o podeis saber. E silêncio."
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