quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Se eu quisesse, enlouquecia.


Se eu quisesse, enlouquecia.
Sei uma quantidade de histórias terríveis.
Vi muita coisa, contaram-me casos extraordinários, eu próprio...
Enfim, às vezes já não consigo arrumar tudo isso.
Porque, sabe?, acorda-se às quatro da manhã num quarto vazio, acende-se um cigarro... Está a ver?
A pequena luz do fósforo levanta de repente a massa das sombras, a camisa caindo sobre a cadeira ganha um volume impossível, a nossa vida... compreende?... a nossa vida, a vida inteira, está ali como... como um acontecimento excessivo...
Tem de se arrumar muito depressa.
Há felizmente o estilo.
Não calcula o que seja?
Vejamos: o estilo é um modo subtil de transferir a confusão e violência da vida para o plano mental de uma unidade de significação.
Faço-me entender?
Não?
Bem, não aguentamos a desordem estuporada da vida.


Herberto Hélder

1 comentário:

  1. Absolutamente FANTÁSTICO, este Herberto Helder e este poema...
    BOM ANO VICENTE!!! Bom ano, meu amigo!!!...
    ...e, apesar de, humana ou desumanamente desejarmos "aguentar" estoicamente esta "desordem estuporada da vida"..., não aguentamos, senão fingidamente!!!
    Um braço bem forte, bem forte e muito Amigo!!!
    Sempre,
    Isabel

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