segunda-feira, 25 de julho de 2011

Diário de um desmemoriado (4)



2ªf, dia 25 de Julho

Parece que o Verão começou em força. Parou o vento e vai-se pôr um dia de calor.

O céu está azul e tudo se propicia para que me sinta bem, mas não sinto.

Tenho saudades daqueles tempos despreocupados de menino e moço em que a rotina da praia de manhã com os meus amigos e amigas, depois de umas horas de ténis bem puxadas, seguidas de um excelente almoço em casa e respectiva sesta, para de novo pelas 5 da tarde voltarmos ao Clube para novas partidas até à noitinha, tornavam os 3 meses de férias um tempo de descanso activo em que retemperava as forças para mais um ano de estudo.

Conversávamos, dançávamos, namorávamos e saíamos à noite para casa uns dos outros e umas vezes ao “Van Gogo”, já mais crescidos.

Talvez porque alguém por detrás tornava a vida das famílias dos portugueses das classes altas, cómoda, segura, de grande qualidade e com prosperidade.

Mas era assim e foi bem bom!

Claro que comecei a crescer, a saber na Faculdade que se chumbasse acabava com os ossos na guerra aonde poderia morrer com uma bala perdida como já tinha acontecido a tantos, depois comecei a viajar e a abrir os olhos e os Verões a serem menos pacíficos pois as responsabilidades de adulto já começavam a pesar e eu sabia que este tempo estava a passar.

E agora, com tanta coisa que entretanto já passou, revolução, liberdades adquiridas que não têm preço, maior justiça e equidade conseguidas, pergunto-me se estou melhor?

A resposta é NÃO!

Deixa pra lá a democracia e tudo o resto que nem discuto, mas ao nível do bem-estar e tranquilidade quanto ao futuro, o dos meus filhos, o dos portugueses, o dos europeus, em suma o de toda a gente….NÃO, estamos TODOS de facto bem piores!

Quando me dizem para tentar “voar alto”, espiritualizar-me e pensar nos valores perenes da fé seja ela qual for, mesmo assim não melhoro mesmo!

Há alguma voz que me diz lá do alto, do meio ou do baixo que tenha paciência que irei para uma vida melhor? NÃO!

Os profundos pensamentos de Buda, Confúcio, Maomé e quejandos trazem mudança à minha alma ou o que se lhe queira chamar? NÃO!

Mudança mesmo, quero eu dizer, tranquilidade verdadeira a que corresponda uma situação de paz interior….talvez momentânea, enquanto as leio e medito, depois passa e a angústia volta, serena, inevitável, irresistível a não ser que sejamos inconscientes.

Se eu pensar na doença, na velhice, no desemprego e na miséria, na falta de união entre os homens, nas calamidades, no terrorismo – tudo realidades à nossa porta – como posso ser optimista?

Não sou de depressões nem de astenias mas sinto uma tristeza grande por já não saber iludir-me como antigamente quando era menino e moço, por ter alguém que pensava por mim!

Sabem que às vezes é bem bom: arranjarem-nos um emprego em que tudo corra bem, me sinta realizado, um país consistente aonde se possa merecer a alegria de cada dia com futuro, para só já falar no entorno que permite todo o resto.

Voltei a reler tudo o que escrevi e falta-me aqui referir o que pode minorar um pouco este azedume, pessimismo, nihilismo:

- a família e o investimento que devo fazer a cada dia em cada um, apesar das sécas, dos hábitos arreigados que me irritam, maçam e que me fazem apetecer isolar-me.

- o amor, no verdadeiro sentido da palavra, o amor espiritual (para além do carnal) aquele que é entrega sem regras pré-concebidas, mais puro e desinteressado, o sentir-me bem enquanto dou e recebo.

- last but not the least, ouvir uma boa música inspiradora que me desligue da terra e me aproxime das nuvens etéreas.

Adoro música e é uma excelente terapia para as minhas maleitas.

Felizmente que sou desmemoriado, senão o que seria todos os dias acumular memórias destas!

No meu ipod estou a ouvir aquilo que vos sugiro que oiçam (podem ir ao you tube tirar estas músicas) e que se chama “Claire de Lune” de Debussy e depois no álbum “Solace” de Michael Hoppe, uma música chamada “Lachrymosa”.

Tem uma enorme força!

(continua)

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