Resolvi ouvir o Requiem em D menor de Mozart, em homenagem ao General sérvio, enquanto escrevo este seu obituário.
Para além do ensino do Português que absorvia com alguma dificuldade mas com muita atenção e interesse, era estudioso e tinha uma gramática feita por ele para compreender os tempos dos verbos e o género que na sua língua, era diferente do nosso.
Tivémos inúmeras conversas ao longo de quase um ano de convivência. Uma prisão de alta segurança não é fácil para ninguém e para ele já com 74 anos, tornara-se insuportável, e só ansiava pela liberdade.
Inteligente, muito bem educado, correcto no tratamento com os outros reclusos, pediu-me ajuda para os novos planos que tinha em mente a partir de Setembro, quando regressasse ao seu país: a produção de caviar a partir de uma nova tecnologia, mediante a criação de caracóis.
Levei-lhe uns livros e fotocópias em inglês para se começar a inteirar. Queria ocupar o seu tempo, trabalhando no campo e ganhando algum dinheiro.
Condenação: por ter estado no lugar errado, no momento errado. Tenho a certeza que ao obedecer ao seu superior, fê-lo por disciplina militar e não por ser criminoso. No entanto como referi atrás as consequências da sua desejável não-obediência ter-lhe-iam evitado a prisão.
Não tenho mais palavras para definir o sentimento de piedade que sinto por ele e que espelha bem a miséria humana na sua expressão mais dolorosa: na sua cela sozinho, mais de 90% do tempo, o que pode um homem com 74 anos esperar da vida e até da liberdade, depois de dezenas de anos recluso?
Não me pronuncio sequer sobre a justeza do julgamento que não conheço e que não me compete apreciar.
Concluo com este desejo sincero: que tenha encontrado a paz antes de fechar os olhos.
Para além do ensino do Português que absorvia com alguma dificuldade mas com muita atenção e interesse, era estudioso e tinha uma gramática feita por ele para compreender os tempos dos verbos e o género que na sua língua, era diferente do nosso.
Tivémos inúmeras conversas ao longo de quase um ano de convivência. Uma prisão de alta segurança não é fácil para ninguém e para ele já com 74 anos, tornara-se insuportável, e só ansiava pela liberdade.
Inteligente, muito bem educado, correcto no tratamento com os outros reclusos, pediu-me ajuda para os novos planos que tinha em mente a partir de Setembro, quando regressasse ao seu país: a produção de caviar a partir de uma nova tecnologia, mediante a criação de caracóis.
Levei-lhe uns livros e fotocópias em inglês para se começar a inteirar. Queria ocupar o seu tempo, trabalhando no campo e ganhando algum dinheiro.
Condenação: por ter estado no lugar errado, no momento errado. Tenho a certeza que ao obedecer ao seu superior, fê-lo por disciplina militar e não por ser criminoso. No entanto como referi atrás as consequências da sua desejável não-obediência ter-lhe-iam evitado a prisão.
Não tenho mais palavras para definir o sentimento de piedade que sinto por ele e que espelha bem a miséria humana na sua expressão mais dolorosa: na sua cela sozinho, mais de 90% do tempo, o que pode um homem com 74 anos esperar da vida e até da liberdade, depois de dezenas de anos recluso?
Não me pronuncio sequer sobre a justeza do julgamento que não conheço e que não me compete apreciar.
Concluo com este desejo sincero: que tenha encontrado a paz antes de fechar os olhos.
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