sexta-feira, 16 de julho de 2010
3ª resposta ao meu primo Luis Bernardo
Meu Prezado Luis Bernardo,
A tua terceira carta foi sucinta, clara e “cirúrgica” : straight to the point!
Hoje gostava de te falar sobre dois temas muito distintos entre si: a Fé em sentido lato e ou a sua falta e por outro lado sobre o sentimento de perca a que a morte, normalmente, conduz.
Começo pela segunda pois é-me mais fácil transmitir-te a minha ideia. Saudades, palavra bem portuguesa, mas com equivalências de “miss you”, “tu me manques”, “te hecho de menos”, e por aí adiante em quase todos os idiomas.
Sim, tenho saudades de fazer festas, ter agarradas e apertadas nas minhas, as mãos bonitas e bem feitas de pele macia, com dedos finos e compridos, da minha Mãe.
Sim, tenho saudades do meu Pai por toda uma vida de serenidade e estabilidade que nos deu e no fim, quando já doente e sem voz por uma traqueotomia, ficava aflito por acordar, o filho de turno de cada noite que o vigiava, sabendo que íamos trabalhar no dia seguinte. Eram uns olhos inesquecíveis de pedido e de agradecimento a que só sabíamos responder, engolindo para dentro a nossa emoção: “ ó Pai, pelo amor de Deus, era só o que mais faltava que não fizéssemos”!
E podia ir por aí fora falando-te de todos a quem amámos, por particularidades engraçadas, únicas e especiais, excêntricas algumas, banais outras mas fazendo parte de um acervo de memórias que constituem um núcleo de sentimentos generosamente partilhados entre pessoas a que chamamos de Família.
Conversaremos um dia sobre como filhos e descendentes de famílias infelizes podem não sentir isto que te transmito e que me faz, no meu caso e ao contrário, valorizar o tal sentimento de perca, como acima te referia.
A Fé, definida de uma forma simplista como a “tábua última de salvação” quando tudo falha, conceito este aceite pacificamente por quase todas as religiões e crenças.
E a falta de fé sentida por ateus, agnósticos e indiferentes, fenómenos estes que se têm vindo a tornar num tema cada vez mais actual, até pela desorientação, crise e desgoverno do mundo em que vivemos.
Aliada a uma crescente confusão/contestação doutrinal de cada credo, à falta de esperança num futuro melhor, às desgraças e calamidades que afligem a Humanidade, ouvem-se grandes cépticos clamar que não têm fé mas que gostariam de sentir algo por alguém, algures e assim não chegarem a um vazio intelectual.
Também é verdade que nunca houve tanta gente bem intencionada e sem fé à procura da sua “raison d’être”!
Tantas vezes nos ríamos das histórias que recordávamos dos nossos familiares e que nos foram passadas oralmente ou por escrito de geração em geração.
Estes, meu Caro Luis Bernardo, são momentos bons, felizes e merecedores de serem ou terem sido vividos com os nossos “mortos” na terra.
Por isso a minha perplexidade por este silêncio e mistério do anúncio de um futuro para além da morte que se presume pelo menos diferente, deixando à mercê dos mais inteligentes ou calculistas doutrinas de antevisão e certezas de coisas que não sabem MESMO!
Aqui te mando “saudades grandes” dos tempos em que convivemos, agora um pouco mais mitigadas por este reencontro epistolar tão rico e intenso.
Um abraço amigo do teu primo
Manuel
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