A POSSE DE TRUMP E A REPORTAGEM DO PENINHA
O Peninha conseguiu que lhe validassem o bilhete de regresso de Caracas a Washington, devido ao infortunado azar de ter adormecido a bordo e falhado a sua saída nos USA!
Tendo chegado a Washington na véspera da posse do Presidente-eleito Donald Trump, hospedou-se num pequeno e modesto hotel junto do Capitólio, que a agência lhe reservara em Lisboa.
O primo John vociferou contra tudo o que Peninha tinha proposto: o traje para estar presente na cerimónia bem como, em caso de entrevista a algum órgão de informação, as ideias que alinhara que eram o oposto das expressas por Trump.
Assim que, recomeçou tudo: foi a um armazém de roupas e comprou uns jeans normais, uma camisa aos quadrados e um blusão de couro castanho-escuro, uns ténis pretos NIKE e numa loja de souvenirs levou um cap que dizia “Madeira -1968”. Pareceu-lhe um gesto de portuguesismo, ainda que nunca tivesse ido à dita ilha mas em homenagem ao primo John que tinha emigrado directamente de lá, e que ficaria contente em vê-lo aparecer nos écrans com este toque de gentil sensibilidade. Só não percebeu o porquê da data – 1968 – mas a menina do balcão disse-lhe que o pai dela tinha-o lá desde essa data e que ninguém o tinha comprado, entretanto!
Voltou a ler alguns recortes de jornais e revistas portuguesas sobre o Trump e apercebeu-se que tinha interpretado tudo ao contrário: o homem era de direita, conservador, tinha vontade de esganar os mexicanos e construir um muro junto à fronteira, odiava outras raças nomeadamente a muçulmana, enfim, concluiu que ali estava o exemplo de um estadista de valor e defendendo os princípios por que o Peninha sempre pugnara, inclusive na sua aldeia, quando era miúdo e jogava ao berlinde com os outros colegas de escola. Sempre admirara o dr. Paupério que era o senhor rico da terra, que tinha uma casa boa e farta e que não se dava com ninguém da vizinhança, nem os filhos jogavam ao bilas com ele e os outros. Peninha achava bem; ricos de um lado e pobres do outro. Pareceu-lhe que Trump devia ser um dr. Paupério da América e rejubilou com o facto. Assim é que era, nada de modernices nem de abrir as portas dos países aos outros estranhos.
A única coisa com que discordava era da segregação em relação à ILGA, pois o Américo era bicha desde pequeno e mesmo na escola já era chamado de Toninha, mas isso nunca o tinha impedido de com ele brincar.
Peninha achava mal qualquer discriminação fosse de que tipo fosse e por isso haveria de dizer publicamente e com orgulho, se por acaso fosse entrevistado, que não estava de acordo!
Enfim, chegou o grande momento. O Peninha não tinha mais do que o 2º ano do liceu de antigamente, pois tinha ido logo trabalhar, mas a vida tinha sido uma escola importante pelo que falava razoavelmente o inglês, ainda que com alguns erros, sobretudo verbos e vocabulário, mas dava para perceber tudo o que se ia passar.
Entrou no recinto com umas três horas de antecedência e de facto o lugar que o primo lhe arranjara era muito bem situado: junto das escadas do Capitólio, numa zona reservada a técnicos de electricidade e de som, que asseguravam que tudo corresse sem problemas.
Claro, não tinha Senadores nem Congressistas, mas tinha a imprensa que fazia a cobertura do evento, em cima, num estrado.
Começou a meter conversa com os vizinhos do seu lugar que se apresentaram simpaticamente: um, era um talhante do Arkansas, já entradote e que viera sem a família que ficara a tomar conta do talho. O Peninha ficou um pouco admirado quando lhe disse que era português e de Lisboa e o homem respondeu-lhe que sabia muito bem aonde era o país – Madagáscar - com um ar convencido. Peninha referiu-lhe o nome do seu clube – o Sporting – um dos maiores da Europa e o tipo ficou na mesma. Quando, já irritado, lhe falou em Jesus, ele disse-lhe : “Of course, that one I know!” Peninha não lhe achou muita graça pois pareceu-lhe de uma ignorância atroz.
A outra, era moça jovem, um pouco máscula e pareceu-lhe que seria travesti pois disse-lhe que se chamava Persifal mas que era conhecida por Gina. Ora fez-se luz na cabeça de Peninha e lembrou-se do Américo e da Toninha e tal e coisa. Muito simpática apresentou-lhe várias amigas, e foi-lhe dizendo que era jornalista de um jornal famoso em Nova Iorque, dizia ela, de nome “Pussy Cat”! Achou o máximo e pensou logo que estaria ali a oportunidade de falar à imprensa.
Conversaram muito sobre o Trump e sobre o futuro, enquanto aguardavam a chegada das altas individualidades e dos principais participantes na tomada de posse.
Entretanto, Peninha reparou que na zona dos jornalistas para além de um ecrã aonde se via o desenrolar da cerimónia havia uma aparelhagem, que lhe pareceu de escutas. Indagou da sua vizinha jornalista, que com um piscar de olhos lhe disse:
- Pusemos uns microfones na zona dos VIP para ouvirmos os comentários e depois os publicarmos. Peninha ficou muito intrigado pois pareceu-lhe coisa do Correio da Manhã ou mesmo do Expresso.
De facto começaram a chegar os ex-presidentes e Peninha foi-se aproximando e começou a tomar notas:
- Jimmy Carter para a mulher: que grande maçada, ainda por cima acho o Donald um grosseiro e um boçal. Só aceitei vir porque sempre somos vistos e há anos que não nos ligam nada. Olha chegou agora a Hillary com o Bill Clinton. Ele está muito velho. Oiça dizer que ainda cutuca as secretárias da Fundação…
- Hillary para Bill Clinton : Estou-lhe com uma raiva! Claro que vou sorrir e fingir que está tudo bem, mas tu ao menos podias agarrar-me nas mãos como se fôssemos muito unidos, para dar uma imagem de casal feliz. Que velho está o Jimmy Carter, caquéctico e ela mal vestida, nunca souberam ter classe. Olha para lá Bill e sorri!
- George W. Bush para Laura Bush: Tu não achas que a Hillary está muito tensa. Nem sei como se vão falar, o Trump e ela. Está gorda e sem graça nenhuma e o Bill está a cair da tripeça. Olha eu tenho saudades destas honras e mordomias, no fundo foi para isso que fui presidente.
- Obama para Michelle: tu, contém-te e não faças cara de enjoada, um dia ainda voltamos a isto tudo, prometo-te. Fomos muito melhores do que aquela cambada dos ex-presidentes, que ali estão a sorrir-nos.
O Peninha estava perplexo, pois julgava que todas aquelas amabilidades que via entre eles, não fossem tão hipócritas.
Obama para Michelle: Olha-me para a Melania, copiona, está com um vestido igual ao da Jackie Kennedy. Ela quando te deu o presente esta manhã à porta da Casa Branca, estendeu-te a mão…safada, fizeste bem em dar-lhe logo dois beijos! Quem se julga ela que é?
Michelle para Obama: Vem bem vestida e tu não me deixaste comprar nada melhor do que este meu vestido, que eu acho sem glamour nenhum! Foste sovina!
E continuaram a dizer mal uns dos outros até que chegou Trump.
Trump para Melania: Finge que me dás um beijo sentido e ri-te minha estúpida! Estás aí entrouxada nesse vestido…põe-te mais à vontade. Foste às aulas de protocolo mas eu sei mais do que esses chulos. Cambada de gente. Vou ali ser visto outra vez a dar manteiga ao Obama pois eles vão ficar para morrer quando ouvirem o meu discurso.
Melania para Trump: estou farta disto e de armar que nos damos bem. Vou mas é para NY e levo o puto e não julgues que volto cá muitas vezes. Ele também detesta isto tudo, olha-me para a cara desatenta dele. O marido da Ivanka, não perde pitada e está com o peito todo cheio. Vocês estão bons um para o outro. Espero que ela te controle, só tens dito asneiras. E deixa de te peidares que é uma vergonha.
E o Peninha desolado via os seus sonhos da política como uma coisa sã e preciosa, esboroarem-se como um castelo de cartas. Todos uns pulhas!
Voltou para o lugar para ouvir o discurso de Trump. Ali ao lado dele eram todos fans, mas o Peninha estava desiludido com as ideias e as generalidades: achou que não tinha plano nenhum.
Quando o discurso acabou e enquanto tocavam as bandas, a sua vizinha do jornal o “Pussy Cat” perguntou-lhe se aceitava responder a três perguntas para publicar com a sua fotografia, no jornal. Peninha ficou encantado e disse logo que sim.
- Qual é a tua orientação sexual? – perguntou-lhe ela.
O Peninha ficou um pouco surpreendido e antes de responder pensou para si mesmo: sempre fui um homão e gostei de gajas.
- Olha sou hétero e gosto muito de mulheres – respondeu o Peninha. Viu que a sua resposta não tinha agradado muito à jornalista.
- 2ª pergunta: sabendo tu que eu sou travesti, ias para a cama comigo? – lançou a jornalista com um ar de desafio para o Peninha.
- Nem penses nisso filha ou filho, sei lá, não saberia o que te fazer, mas olha que tenho amigos como tu e damo-nos muito bem. Eu não tenho preconceitos, disse o Peninha com um ar satisfeito pela sua posição liberal. Mas olha, faz-me uma pergunta sobre política, sobre o Trump, a América.
- 3ª pergunta – gostaste do vestido da Melania? – e acrescentou á laia de desculpa que nada sabia sobre política. Peninha desgostado, a contragosto disse-lhe:
- Gostei das mangas em godé, do cós alto, do busto saliente e da gola em rodovalho tipo cachecol…o azul bebé fica-lhe bem ainda que ela não seja nenhuma inocente. Das luvas, achei chic a valer.
Peninha saiu desconcertado da entrevista pois tinha sonhado dar opiniões políticas profundas e avisadas.
Voltou para o hotel para se vestir para o baile. Tinha trazido de Lisboa um smoking emprestado do Américo, de veludo lavrado em encarnado vivo, com umas calças escuras e uns sapatos com umas solas novas que o faziam escorregar. Pôs uma écharpe de seda azul escura à volta do pescoço, pois estava frio, e com um cravo branco na lapela, meteu-se num táxi e zarpou para o local do baile.
Lá chegado, de convite na mão apresentou-o à entrada e ouviu um comentário em voz baixa que lhe fez uma das meninas recepcionistas:
- I love the colour of your tuxedo, but I have to warn you, President Trump is a conservative and doesn’t like red, it reminds him of the communists, at least until he meets Putin…but I love it. Do you dance?
Peninha ficou encantado com o elogio e respondeu logo que sim e que ficava à espera dela para quando começasse o baile ela ser o seu par.
- Chamo-me Elsie ( Elsa, pensou o Peninha) e tu?
- Eu chamo-me Little Feather (Peninha) but I guarantee you that I have what you expect very big…e riu-se ainda que tivesse achado que tinha sido um pouco grosseiro.
Entrou para a sala gigantesca aonde se desenrolaria a festa e notou que havia um palco mais elevado que lhe disseram ser só para o Presidente Trump e a mulher abrirem o baile. Achou de uma arrogância e pretensão desmedidas e logo ali planeou que tentaria ir com a Elsie dançar para lá e assim, ao menos, poder aparecer na imprensa, pois os fotógrafos estariam todos de baterias apontadas.
A sala começou a encher-se mas o convite do Peninha só dava direito a ficar em pé junto ao bar e não a jantar. Assim fez e enquanto Elsie não chegava, começou a beber desenfreadamente: estava excitado com o ambiente e Elsie era rechonchuda, de rabo grande saliente do vestido comprido branco com uma racha atrevida lateral que deixava entrever umas belas pernas, tinha um peito de rola grande e cheio e uma cara agradável com uns olhos morenos e cabelo castanho claro.
Entretanto a orquestra começou a tocar umas musiquinhas gostosas e Peninha com os copos, meneava o corpo dando um bocado nas vistas.
Elsie foi ter com ele e enlaçados começaram a aproximar-se da pista que já tinha alguns pares de convidados a dançar. Peninha disse-lhe ao ouvido que ela estava muito sexy e confessou-lhe o seu desejo de irem disfarçadamente lá para o palco de cima para que quando o casal Trump começasse a dançar eles entrarem os dois também no mesmo palco e teriam um momento de fama…Ela ficou estarrecida com a ideia e falou-lhe na CIA e no FBI mas ele não se demoveu.
Elsie disse-lhe que a única maneira seria a de pretenderem ser da organização e estarem de serviço,sim não levantariam suspeitas e só mesmo quando a primeira valsa começasse poderiam então deslizar para o palco…Elsie achava uma loucura mas como já tinha bebido uns copos valentes como o Peninha, ia cedendo molemente.
Encontraram vária segurança a quem Elsie dizia que era da organização e sem grande dificuldade ficaram perto do palco, como se de meros observadores se tratassem e estivessem ali à disposição para qualquer coisa.
O casal Trump, chega ao palco e é saudado pelos convidados em delírio. A orquestra começa a tocar a valsa do Danúbio Azul e o casal Trump vai deslizando pela pista sob os aplausos de todos. Toda a gente está concentrada nos convidados de honra e não se apercebem de que Elsie e Peninha se vão aproximando do centro do palco, dançando ao som da valsa.
Os organizadores tinham tido ordens para espalharem no chão pó de talco em grande quantidade para facilitar ao casal Trump os passos da valsa e poderem rodopiar facilmente.
Numa volta mais ousada, o raio dos sapatos com solas novas que o Américo lhe emprestou, derrapam no chão escorregadio e perante o olhar assustado de todos, o Peninha estatela-se no chão dando um enorme trambolhão indo parar ao pés de Melania.
O FBI já tinha entrado no encalço dos dois e leva-os presos para interrogatório.
Foi um sarilho e só depois de muitas explicações, o Peninha conseguiu ser libertado.
Ansioso correu para um quiosque à procura dos jornais aonde tinha a certeza estaria noticiada a sua proeza, ainda que tendo acabado mal. NADA!
A equipa de TRUMP tinha censurado esta parte da festa e NADA deixara que os jornais reportassem. Peninha ficou tristíssimo e regressou a Lisboa.
Um dia depois do seu regresso recebeu um e-mail de Persival com um attachment aonde vinha na primeira página do jornal “Pussy Cat” a fotografia do seu estampanço!
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