sábado, 7 de abril de 2012

Aimberê - Meus contos brasileiros


Eu mudo pra caramba. Minhas roupas, meu cabelo, minhas visões sobre as coisas, meus amores, meus desgostos, minhas músicas.

Não consigo entender aquelas pessoas que não mudam. Ficam no mesmo emprego durante anos, com o mesmo corte de cabelo e se relacionando com as mesmas pessoas.

Outro dia mesmo eu estava na paragem do ônibus e encontrei um simpático português que se sentou a meu lado e eu tenho que confessar que gostei da conversa.

Já mudei 9 vezes de casa. O lado bom disso são as histórias, e bota história nisso! O papel de parede horrendo arrancado com a mão; a minha babá má, que me fazia comer espinafre todo dia e recolher todos os lápis de cor de baixo do sofá, lá na casa de meus pais; minhas fugas por cima do muro do prédio na praia; o cheiro de coisa velha do armário da casa do meu avô...

O lado ruim é que eu não fiquei tempo suficiente em nenhum desses lugares até eles ficarem com o meu cheiro. Sou muito exigente com os cheiros das coisas. E das pessoas também. Não costumo gostar de alguém que use um perfume que não me agrada. Nada pessoal, só não gosto de ficar perto. Pode ser que seja um exagero meu, mas em que eu não exagero sempre? Minha vida toda sempre foi baseada em exageros. Ou eu estou bem ou eu estou mal, sem meio termo. Exagero na hora de fazer o prato de comida, de me emocionar com um filme, de amar alguém, de não gostar de alguém, de contar histórias... Quem sabe metade desse texto não foi puro exagero? O ponto é, exagerando, mudando, eu vou vivendo, e vivendo muito mais do que qualquer realista por aí.

Ele se chamava Manuel e me disse que era típico nome de português. Fomos conversando e ele me perguntou o nome e quando lhe disse que me chamava Aimberê, se riu com um sorriso aberto e a gargalhada doce parecia a do canto do sabiá.

Fiquei um tempo calada e a paisagem passava rápida pela janela do ônibus e o cheiro dele era bom, usava um perfume de que logo gostei.

A viagem ainda era longa, por isso saboreei o tempo que teria à nossa frente para um bom papo.

Senti a voz semi-brasileira dele fazendo um esforço para usar o sotaque, e olhei com um ar divertido e guloso para ele. Que cara bacana, tentando me agradar.

Porque me chamava Aimberê, perguntou Manuel. Me disse que era um nome tão invulgar que devia vir de alguma estrela cadente e quente. Sabia a índia, a tribo, a liberdade.

Resolvi ir com ele, fosse ele para onde fosse. Me disse que ia para a Aldeia da Serra e eu lhe disse que era justamente o meu destino.

(continua)

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