domingo, 29 de novembro de 2020

A partida do Zé


A partida de alguém é sempre patética: traz dor, saudades, tristeza e como que se ficássemos espantados e não esperássemos que um dia haveria de chegar mas, seguramente duvidosos do destino do morto. E agora para onde?

Não me importa o ponto de vista das diversas religiões, pois em nenhuma até agora houve notícias reais da existência de uma vida...que conceito de vida poderia ser, para além da morte.

Discuti várias vezes com o Zé este tema quando ele abordava o sentir que caminhava para o seu fim. Fazíamos um trato que era o de não falar nem da minha nem da dele. Assim estávamos mais à vontade e sem medos.

Cada um trazia para a conversa livros que lera, artigos de cientistas, de religiosos de vários credos, histórias de "retorno" de doentes que contavam a visão de um túnel de luz e uma vontade de não regressar, mas no final nada tínhamos avançado.

Tenho para mim que o melhor será despreocupar-nos sobre o after-death e ao contrário tratarmos de viver bem enquanto estamos vivos. 

Há tanto para melhorar, enriquecer em amor, cultura, valor profissional, social e de entrega a quem precise, e uma permuta de tudo isto com e de quem gostamos.

Por isso quando a morte chegar, seja de mansinho ou de forma estrepitosa, ou com sofrimento, a expectativa de no fim da vida se ter paz, deverá afastar o medo.

A memória dos nossos mortos é temporária e ao mesmo tempo permanente. Ficam-nos gravadas as histórias de e com cada um/a e passadas as primeiras semanas a vida continua e nem deve ser amargada por uma atitude de luto permanente pois torna-se cansativo e às tantas já nem temos um propósito pois os mortos não retornam.

Interessa sim, estar atentos a uma frase que alguém diz e de repente revêmo-nos num momento de grande lembrança e intensidade de emoções e de saudades, numa música, num sítio, tudo isto por casualidade pois é o que nos dá a certeza de os "chorarmos" com naturalidade.

Querido Zé, obrigado pela tua amizade e presença na minha vida. Foi sempre amistosa e permanente e tenho a certeza que valeu a pena para os dois esta mútua partilha dos nossos defeitos e qualidades.

É isto que se deve fazer, na minha opinião: ser gratos no nosso coração com quem parte e termos a humildade suficiente de reconhecermos, se porventura fomos úteis ou de ajuda, nada disso interessa pois não há um Livro do Deve e do Haver, na contabilidade do amor.


 


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