quarta-feira, 4 de outubro de 2017

A Raínha de Espanha que era Portuguesa

A Raínha de Espanha que era Portuguesa

Sabem que existiu uma Rainha de Espanha que era PORTUGUESA e que foi também uma imperatriz europeia?

E tudo envolvido numa extraordinária história de amor.... que começou com um casamento por dinheiro!

Ora leiam:

Antes do rei de Portugal que era espanhol - Filipe II e I de Portugal - Os espanhóis tiveram também uma regente (Rainha consorte) que era portuguesa - a sua própria Mãe.

D Isabel de Portugal era filha de D. Manuel I e de D. Maria, a segunda mulher de D. Manuel. E viria a ser avó de D Sebastião. Seu pai, D Manuel, projectou-lhe o casamento com o Carlos V, imperador de Espanha e da Europa. Do Sacro Império Romano Germânico. O que ocorreu em 1526, já a infanta tinha 23 anos.

Porque é que D Manuel terá tido a ideia de casar a filha com o imperador?
A península Ibérica estava a atravessar um fortíssimo movimento para a unificação política. A península antiga, a do séc XII, estava dividida em vários reinos: Leão, Castela, Navarra, Aragão, Granada e Portugal, Eram 6 reinos. Desses 6 reinos, 5 deles já estavam unidos. Só faltava Portugal.

Como é que se podia defender a independência de Portugal?
Em politica internacional há só 2 caminhos: um é a guerra e o outro é a Paz.
E realmente o nosso Rei Afonso V tentou o caminho da guerra. Fez a guerra e perdeu-a.
O filho de D. Afonso V, que é o D João II, já vai pelo caminho da Paz. Em vez de combates faz casamentos.

Casa os príncipes portugueses com princesas espanholas. Porque isto cria um clima de aliança entre os 2 países.

Portugal e Espanha têm que conviver no mesmo espaço. E já que assim é, melhor que convivam como amigos do que como inimigos.
É por isso que D João II casa o seu filho único com uma princesa espanhola. Mas o príncipe morreu pouco depois numa queda de cavalo. Partiu o pescoço e morreu passadas umas horas.

Sucede-lhe D. Manuel I, que vai casar com a viúva desse príncipe - que é a princesa D. Isabel de Castela, mas também teve pouca sorte. A princesa morre do primeiro parto.

D Manuel não desiste. Repete a cartada e casa com a irmã da D. Isabel. Eram ambas filhas dos Reis católicos com quem D Afonso V tinha andado em Guerra.
D. Manuel casa com a irmã, que é a D. Maria, e desse casamento teve 7 filhos. E depois da D Maria morrer, em 1517, ainda vem a casar com uma sobrinha sua (da D. Maria)!. Quer dizer: as 2 primeiras mulheres de D. Manuel eram filhas dos Reis Católicos e a terceira era neta dos Reis Católicos.
Das 3 vezes tenta alianças com a Casa reinante em Espanha.

Dos 7 filhos do rei D Manuel, o primeiro é D. João (III de Portugal). E o segundo é a Infanta D Isabel. O D. João III casou logo com uma princesa espanhola. Com a D. Catarina que era também uma neta dos Reis Católicos.

Para a segunda filha o casamento ideal seria com o próprio Carlos V que iria ser Rei de Espanha além de Imperador da Alemanha, e isso teria para Portugal muito prestígio. Tratava-se do principal monarca da Europa.

Carlos V tinha herdado 4 grandes heranças reais dos seus 4 avós: da avó rainha Isabel de Castela, herdou o Reino de Castela. Do avô Fernando de Aragão, o reino de Aragão. Do avô Maximiliano da Alemanha, a Coroa Imperial da Alemanha. E da avó Maria de Borgonha, a Flandres e todos os países Baixos.
E isto realmente faz um Império europeu, embora não contínuo. São regiões isoladas.
França, por exemplo, é central e não faz parte do império.

Estas regiões isoladas obrigavam o Imperador a um grande trabalho.
Carlos V estava em guerras constantes. E, para manter as guerras, precisava de dinheiro.
E é exactamente isso o que o leva a optar pela D. Isabel portuguesa.
Repare-se que ele podia casar com quem quisesse, qualquer princesa na Europa gostaria de casar com aquele grande Senhor.

Um Casamento por dinheiro que se transforma na mais bela história de amor...

Mas ele opta pela princesa portuguesa principalmente porque era a princesa que lhe ofereceu o maior dote.
As negociações demoraram muitos anos e acabou por se estabelecer um dote de 900 mil dobras de ouro espanhol. Era uma quantia enorme! Diz o cronista Damião de Góis que "nunca uma princesa levou um dote tão grande".

E Carlos V precisava imensamente de dinheiro para fazer a guerra. Foi portanto um casamento politico de interesse, apenas. Ele nem conhecia a noiva.
Mas esse casamento acaba por se transformar numa linda história de amor.

Casam em 1526. Ela vai até Sevilha mas Carlos V atrasa-se e chega apenas 5 dias mais tarde.
Mas logo que a viu se apaixonou.
Ela era muito bonita, tinha um temperamento sereno, era afectuosa e sobretudo muito culta e inteligente.

Ele tencionava estar ali pouco tempo mas acontece que eles vão para Alhambra de Granada, onde passam 5 meses de lua de mel.
Foi o único tempo que Carlos V concedeu a si próprio.
Esteve 5 meses com a mulher em Granada e ela nunca mais se esqueceu disso.
Foram os únicos 5 meses felizes da sua vida. D. Isabel, no seu testamento, escreveu que quando morresse queria que fosse enterrada em Granada, em lembrança do tempo que ali tinha passado.

Mas esse tempo de amor não podia durar muito. Carlos V não era apenas Rei de Castela. Também era o Imperador da Alemanha. Uma Alemanha inquieta onde tinha acabado de surgir um Lutero, o protestantismo, as revoltas contra os senhores. Uma Alemanha que era um autêntico vulcão.

Carlos V era também o Senhor dos Países Baixos, da Flandres.
Era também Rei de Aragão e, como tal, o Rei de grandes possessões em Itália. Uma Itália também sempre inquieta.
Por isso, depois desta lua de mel, Carlos V sai de Espanha e está 4 anos ausente.

É impressionante a correspondência que ele troca com a Imperatriz. O sentimento entre eles foi muito forte.
Com Carlos V longe de Espanha, é ela a regente de Espanha. A Raínha Consorte.
Prudente, inteligente, equilibrada, durante anos é ela quem governa todos os negócios em Espanha. Dizia-se é como se Espanha tivesse dois Reis.

O imperador, para além de ser muito poderoso é um homem superiormente inteligente e tem um projecto: unir toda a Europa.
Uma Europa só com UM Chefe, UMA fé UMA política.
O chefe é ele. A política é a da Paz, e a fé é a Católica.

E Isso era mesmo necessário porque a Europa atravessava um grave perigo.
Os turcos vindos do Oriente tinham atravessado já o mar Egeu, apoderaram-se da Grécia, ocuparam a Bulgária, chegavam já a cercar Viena.
Era a Europa que ameaçava cair sob a invasão terrível dos Turcos. A Europa tinha que se unir para se defender e o campeão dessa unidade é Carlos V.

Mas contra ele não havia só a ameaça turca.
Havia também aquela terrível fermentação ideológica luterana vinda da Alemanha. Ele não conseguia ter a Alemanha unida. Nem sequer sob a mesma Fé.

Havia também a França que não fazia parte deste bloco mas que queria manter a sua independência e a sua Unidade. E fez uma guerra terrível contra Carlos V. Este acabou por vencer e até por prender o Rei de França. Mas era preciso exércitos, soldados e dinheiro.

Quem é que tinha mais dinheiro? Os ricos países da Flandres.
Carlos V esmagou-os com impostos. E os flamengos revoltaram-se.
E ele agora tem 4 inimigos contra si. Os flamengos revoltados, os turcos que o invadem, as cidades da Itália que se sobrelevam, e também a Alemanha protestante.
Carlos V lida com guerras durante 40 anos.

Entretanto, em 1536, a imperatriz morre na sequência de um parto.
Ela foi tendo vários filhos que iam morrendo em crianças. E ela própria acaba por morrer em Toledo com apenas 36 anos.

O imperador teve um desgosto profundo que o vai acompanhar toda a sua vida.
Ele nunca mais viria a esquecer aquela mulher. Não voltou a casar, e com o tempo aquela imagem vai-se tornando mais dominante.
Quatro anos depois dela morrer, ele chama um grande pintor - Ticiano - e pede-lhe que lhe pinte um retrato da imperatriz. Ticiano serve-se de outros retratos e faz-lhe uma imagem linda. A que apresentamos neste texto.

Depois de 40 anos de luta, Carlos V percebe que o seu sonho não é possível. A Europa não pode ser unida E então, com 56 anos, em 1556 ele reúne em Bruxelas com as principais figuras do Império e abdica. Diz ele: "durante todos estes anos tentei, por todas as formas, fazer a paz na Europa. E construir uma grande Europa Unida. Não consegui".

Abdicou da coroa de Espanha para o seu filho Filipe II. Que viria a ser o II de Portugal.

No ano seguinte abdicou a coroa imperial da Alemanha no irmão, Fernando. E retira-se. Para um convento pobre em Castela.

Na frente do leito mandou colocar o retrato de Isabel de Portugal, pintado por Ticiano. E foi com os olhos postos na Princesa portuguesa que ele expirou em 1558.

Amou-a na vida e na morte. 


Uma história bonita de uma grande portuguesa que ajudou a fazer a Paz na Península.

João Tilly

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