Meu Querido Manuel,
A festa dos teus Pais foi um deslumbramento. Pediram ao "29" que lhes desse
uma mão e ficou como sempre muito bem arranjado.
No terraço grande em frente da casa começava uma tenda que se alargava para
o jardim imenso. Os canteiros de flores garridas de que o teu Pai tanto gosta e
cuida, estavam um esplendor. De lado, por detrás de umas micas generosas
deixava-se entrever o arvoredo, todo iluminado.
No fim do jardim numa varanda em pedra bastante larga, podia-se ter uma panorâmica
sobre o mundo e como a festa se prolongou até ao amanhecer, os convidados vieram apreciar tanto as vistas da noite como o nascer do Sol.
O terraço tinha sido deixado para palco das representações que se iriam
desenrolar e do espectáculo organizado pelos teus Pais.
Pelo parque sobre a relva, espalhavam-se as mesas que estavam lindas. Com
centros de mesa com candelabros de prata e velas acesas e o serviço de porcelana
armoriada da família, de que tu tens réplica no Alentejo. Os marcadores em
vermeille com o mesmo faqueiro e copos de cristal valorizavam a Companhia das
Índias que em cada mesa, em pequenas terrinas abertas e sem tampa deixavam sair
flores vistosas a dar com as cores da porcelana.
As toalhas em seda beije e com saiote tornavam o arranjo das mesas
imponente. As cadeiras eram confortáveis pois o "29" decidiu e muito bem, que os
convidados deviam estar cómodos.
Criados fardados de libré, serviam os aperitivos que eram deliciosos:
salmão fumado enrolado em cónes crocantes, caviar beluga à colher
sobre blinis, uns camarões frescos em pequenas empadinhas de massa folhada, uns
croquetes de javali quentes e como bebidas, champagne, vinho da Madeira, jerez,
vinho branco gelado Chablis e Carcavelos.
O jantar era muito bom:
- ostras gratinadas com espinafres, acompanhadas por champagne;
- lagostins grelhados com molho de mayonnaise aux fines herbes acompanhado por um
Mosel de primeira ordem;
- um sorbet de lima;
- perdiz estufada com cebolinhas e batata palha e
acompanhadas por um vinho tinto de Chateau Petrus.
De sobremesa um soufflé Grand-Marnier acompanhado de Licor Beirão, et pour
cause…
Um plateau de queijos servido em cada mesa, com Serpa e Azeitão acompanhado
por um Porto Barros de 1919.
No final, havia charutos que tinham sido trazidos pelo Conde de Montérrón,
ele de origem cubana, e as bebidas do costume desde o Drambuie, Whiskies de
malte e sem serem, Cognacs, e Grappas.
Muitos smokings brancos impecáveis e as senhoras muito bem vestidas, com
jóias formidáveis. A parentela esmerou-se.
Lá estavam os Amigos de sempre, os Horta e Costas, os Herédias, os Mónica,
os Andersen, os Vasconcellos Abreu, o Pai Motta Veiga, os Marques Guedes, os
Rebello de Sousa, os Lagos, os Vasconcellos Guimarães, os Paiva Raposo e como
já tinha bebido um bocado, não dei por mais.
Havia uma orquestra impecável e dançou-se bastante. A um dado momento os
teus Pais que estavam elegantíssimos, foram para o terraço e a tua Mãe
agradeceu muito terem vindo à festa e anunciou que se iria começar com as duas
representações referidas num programa que constava no verso de um menu lindo
com a descrição dos pratos do jantar, impresso a grená com um diabinho com uma
cauda no meio de uma frase que dizia: “who’s the
devil, is sitting here?” Por baixo o nome do Convidado. Tudo isto
mandado vir de Bond Street do Smythson, que é único.
Tive uma longa conversa com o teu Trisavô, Dom Francisco Bernardo de Noronha
e Távora, a propósito de uma demanda sobre umas terras e uns palmares bem como
sobre uns palácios e casas em Goa. Acabou por ser o teu Bisavô Souza Andrade
que como juiz da Relação de Nova Goa, dirimiu o assunto. Também encontrei a tua
Bisavó italiana, com quem falei sobre Génova, cidade de que eu gosto tanto.
(continua)
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