terça-feira, 30 de abril de 2013

sombras e vaidade

«É mais difícil ferir a nossa vaidade justamente quando foi ferido o nosso orgulho». 

Nietzsche tinha (alguma) razão: a ferida no orgulho patenteia, amiúde, o sem-sentido da vaidade. 

Sobretudo a vaidade de presumir que todos nos veneram. 

Às vezes, uma ferida dessas pode ser uma terapia. 

Por muito que doa!

João Teixeira

segunda-feira, 29 de abril de 2013

pedir para acreditar sem desistir


 Nossa Mãe! Que brandura e que ternura
Nesta humilde palavra pequenina,
De uma unção virginal que nos domina
E de uma glória que nos transfigura.

É tão doce, tão cândida, tão pura
Que nem num rumor de águas, em surdina,
Ou um cântico de ave, quando trina,
...Em adejos vibrantes, pela altura.

Tomemos e acendamos uma vela.
Pronunciando - Pai - diante dela,
Logo se apaga a débil chama ardente.

Mas se dissermos - Mãe! - a chama, então,
Estremece de funda comoção
E continua a iluminar a gente!

Mons. Moreira das Neves

domingo, 28 de abril de 2013

O Papa Francisco e eu



Ontem, por razões profissionais, tive que ir perto de Fátima. Decidi desviar-me do caminho de regresso e dar lá um salto. Estava uma tarde de sol, pouca gente no Santuário e na Capelinha havia silêncio.

Sentei-me na ponta de um banco e fiquei a ouvir um sacerdote que estava de turno e que fazia pequenas meditações de 2 a 3 minutos e pedia-nos para nelas pensar em silêncio. Gostei muito da ideia e pus-me a fazê-lo.

Às tantas falou de confiança para aqueles com uma fé mais branda ou “esquecida”: confiança na “Senhora com as vestes mais brilhantes do que o sol”, dizia, para através dela se chegar a Jesus.

Voltei a achar que era uma bela sugestão e o silêncio que se seguiu a esta pequena meditação começou a saber-me a paz e senti uma enorme consolação em ali estar.

Fui visitar a nova basílica, que não conhecia, e sempre de nariz no ar, pois sou um curioso danado, vi que havia uma indicação para uma “capela da Reconciliação”. Achei um excelente nome e desconfiando do que se me pedia se lá entrasse, aí me fui aproximando de mansinho.

Coube-me na “rifa” um sacerdote africano com quem conversei todo o tempo em inglês: lembro-me que fui só eu que falei e ele no fim deu-me a bênção e um abraço forte.

Já na despedida concordou comigo, dizendo que gostava muito, muito, muito – repetindo três vezes – do Papa Francisco. Comecei a conversa, dizendo isso mesmo e que era a ele que se devia a minha visita.

Saí de Fátima e vim de volta a Lisboa, realizando como tenho sempre que agradecer tanto e em tudo o que vai acontecendo na minha vida.


sexta-feira, 26 de abril de 2013

coisas secretas

 

Em todas as almas há coisas secretas cujo segredo é guardado até à morte delas. E são guardadas, mesmo nos momentos mais sinceros, quando nos abismos nos expomos, todos doloridos, num lance de angústia, em face dos amigos mais queridos - porque as palavras que as poderiam traduzir seriam ridículas, mesquinhas, incompreensíveis ao mais perspicaz. 
Estas coisas são materialmente impossíveis de serem ditas. A própria Natureza as encerrou - não permitindo que a garganta humana pudesse arranjar sons para as exprimir - apenas sons para as caricaturar. 
E como essas ideias-entranha são as coisas que mais estimamos, falta-nos sempre a coragem de as caricaturar. 
Daqui os «isolados» que todos nós, os homens, somos. 
Duas almas que se compreendam inteiramente, que se conheçam, que saibam mutuamente tudo quanto nelas vive - não existem. Nem poderiam existir. No dia em que se compreendessem totalmente - ó ideal dos amorosos! - eu tenho a certeza que se fundiriam numa só. E os corpos morreriam.
As Coisas Secretas da Alma
Mário de Sá-Carneiro

quinta-feira, 25 de abril de 2013

As comemorações do 25 de Abril - o abandono

Discursos ocos no Parlamento...verborreia democrática e egocentrista com os partidos do "arco governativo"...- estúpida expressão - a defenderem-se de não se entenderem. 
Gostei do discurso da Helena Apolónia dos Verdes (sou do Sporting, o que ajuda) mas sinceramente achei que falou de coisas reais tais como ser necessário haver mais emprego, uma especial atenção para quem tem fome e está desamparado, a reanimação da economia, uma reacção valente às imposições desnecessárias de austeridade, etc. 
Fê-lo sem uma voz esganiçada,que me irrita na menina do BE e da do PCP. 
Quanto a Cavaco Silva foi pena não ter aproveitado para criticar o Governo e ameaçá-lo de que o demite se não mudar de rumo. 
Pão, pão - queijo, queijo. 
Falham-se oportunidades históricas assim com um estalar dos dedos. Ganharia simpatia, e o apoio de toda a Nação desde a direita à esquerda, criaria maior coesão nacional e sobretudo faria PARAR este Governo por algum tempo para reflectir com prudência, neste seu diário ESFALFAMENTO de novas medidas sem eficácia prática nenhuma e com acrescido sofrimento para o comum dos Portugueses.
Não sendo eu de esquerda, como é sabido pelos que me conhecem, vou tendo cada vez menos simpatia e paciência para os salamaleques do centro e da direita, para os seus compadrios e dança de tachos, a sua menoridade mental em observarem a realidade do país e sobretudo pelo seu total desprezo pelos cidadãos, pois a maioria das vezes tudo quanto fazem ou é às ordens da troika ou na defesa dos seus interesses partidários.
Portugal está invivível com toda esta gentalha desde a direita à esquerda. 
Há que mudar de gente!

terça-feira, 23 de abril de 2013

avoir une réponse à tout

La bêtise des gens consiste à avoir une réponse à tout. La sagesse d’un roman consiste à avoir une question à tout.

Kundera

quinta-feira, 18 de abril de 2013

Resposta do meu primo Luis Bernardo - a eterna suspeita e os rumores


Meu Querido Manuel,

Gostei da tua última carta que me fez lembrar o meu próprio casamento. Também eu senti pela minha noiva, a minha Tia paterna mais nova, um enorme amor desde o princípio.

Nascemos ambos em Agosto e tínhamos por isso a mesma idade.

Portugal era palco de um vasto conjunto de reformas com o objectivo de sair da miséria na qual mergulhara devido à diminuição das remessas de ouro recebidas do Brasil.

Debaixo deste cenário, e face às novas políticas mercantilistas que surgiram do pensamento iluminista que ignoravam a estrutura nobiliárquica privilegiando uma lógica de poder economicista, a nobreza portuguesa ficou bastante descontente com o governo do Rei D.José I.

A nossa Família estava contra estas mudanças, pois era possuidora de uma enorme fortuna e da nossa história constavam vários serviços prestados aos diversos Reis de Portugal ao longo dos séculos.

Em Setembro desse ano, o meu Pai tinha acabado de regressar da Índia, onde tinha sido Vice-Rei, e assumiu-se como o porta-voz da discórdia dos nobres e da oposição política às reformas do primeiro-ministro. 

Por isso, Sebastião José odiava a nossa família.

Passámos anos felizes e o nosso amor foi crescendo, mas a vida da Côrte era traiçoeira e os Reis tinham esse triste hábito de perturbar as vidas dos casais felizes, apaixonando-se por mulheres casadas. A Tereza era formosa, muito alegre e culta e divertia o Rei.

A partir de uma certa altura, passei a vê-la pouco a não ser quando íamos ao Paço, que estava instalado numas tendas reais fóra de portas, pois o Rei temia que os abalos do terramoto se repetissem.

Tereza, dançava muito com todos e em especial com o Rei e reparei que a afeição que ao princípio tinha por mim, esfriara e de mulher dócil e prazenteira, passou a frívola e cortesã.

Ocupava o meu tempo nos afazeres do cargo e na administração dos bens familiares e ela tinha uma vida própria. Passámos a dormir em quartos separados e eu sabia que entrava tarde muitas vezes, pois ouvia o barulho dos cavalos e da carruagem a chegar a altas horas.

Havia rumores de que era amante do Rei, mas eu confrontei-a várias vezes e sempre o negou e eu conformava-me em achar de que não era mais do que uma mera aceitação da corte por parte do Rei.

Depois da minha morte, supliciado que fui no cadafalso, ela nada sofreu, sendo apenas encerrada no Convento das freiras do Rato, talvez com a ideia de em breve a soltarem, mas o Rei, parece que depressa se esqueceu dela, pois no Convento passou o resto da vida, morrendo em profunda miséria.

Triste carta esta que te escrevo a propósito das tuas considerações, meu Caro Manuel.

Um desditoso abraço do teu primo

Luís Bernardo

A dor calada por Luis Osório

 
A dor calada ensurdece os ouvidos. Mais do que as lágrimas ruidosas ou os gritos de raiva, mais do que qualquer revolta que possa nascer com palavras, ela fere de morte os que a sofrem. Ninguém à volta a ouve, é como se não existisse, uma dor muda que fala para dentro, entorpece, esmaga com um alfabeto de letras impossíveis de serem entendidas. São as que ficam. Ao contrário das outras, que se resolvem com a paz dos problemas, não terminam quando tudo parece estar bem. São amigas fiéis. Dores mudas… para os outros.

Luís Osório

quarta-feira, 17 de abril de 2013

Carta ao meu primo Luis Bernardo - ideias primaveris - o casamento



Meu Caro Luís Bernardo,

Hoje está um dia lindo e apesar dos problemas que nos afligem e de que não sabemos como nos iremos safar, apeteceu-me falar-te do tema do casamento.

Quando nos preparamos para a ideia de casar, para além de um vínculo jurídico seja ele canónico ou civil que se venha a contrair e mais recentemente com as uniões de facto que são as antigas palavras de futuro trocadas no auge de um arrebatamento, traduzido depois numa convivência continuada sem algum “papel”, há uma “affectio” (afeição) inicial que justifica a selecção do parceiro ou parceira.

Trata-se das primícias das mais puras emoções , daquelas que inspiraram poetas, escritores, pintores, escultores, trata-se de algo muito etéreo, sonhador, leve e ao mesmo tempo intenso, porque é a antecâmara da paixão, que por definição é febril, violenta, desregulada, cega e consoladora.

E quando ao pensar no ser amado/a o coração é invadido por uma doce sensação de bem-estar, de melancolia, de sonho de uma vida a dois em que tudo parece sorrir, fundam-se consistentes esperanças de se ser eternamente feliz. 

Estas são considerações românticas, mas no fundo de cada um de nós nesses momentos estes são ou foram os pensamentos que ocorreram, consoante a sensibilidade e poder descritivo de cada um. 

Ninguém pensa que bom que vai ser repartir boas sessões de iPad com a Sandrinha, ou ver “Kung-fus” com o Hélder, enterrados num sofá em casa durante horas….ou antecipar grandes “empazinadelas” na tasca da esquina com “jolas”….isto tudo vem depois, quando, parece-me, se instala a rotina, o perder da novidade, um futuro que de alguma etérea ilusão, faz cair os casais, na realidade pura e dura da vida difícil para o amor no dia-a-dia.

Na constância do matrimónio (como se diz em direito canónico  - fui Juiz do tribunal da Rota de Lisboa durante alguns anos – anulações de casamentos católicos), importa mais vigiar em como se protege o amor.

Muitas vezes deixamo-nos invadir pelo egoísmo, pela embirração e pouca paciência para os defeitos do outro, e tantas outras coisas que sabemos destroem a relação, moem por dentro, fazem ranger os dentes, entrombam de modo a que cada um se vire na cama para o outro lado e adormeça em silêncio sem dar as boas-noites – e talvez, se de tempos a tempos, viessem à memória, estimulada por pequenos truques, os sentimentos e emoções de bem-estar e de esperança que presidiram à decisão de “juntar os trapinhos” seja ou fosse até de que maneira o tenha sido, como tudo poderia, quiçá, ser melhor! 

Inspirei-me hoje, na candura desta tela que reproduzo acima, quase que adivinhando que na tranquilidade e gesto da noiva ao pegar na pena leve para assinar o seu compromisso, estaria igualmente dentro de si um desejo de “assegurar” num contrato, uns anos de felicidade.

Fantasias de uma tarde gloriosa de sol e de luz!

Um abraço amigo do teu primo muito afeiçoado

Manuel